O parágrafo-gancho do editorial “Tolerância”, do ex-ministro do Planejamento (1985-87) João Sayad (Ph. D. em Economia, Yale University), na Folha de São Paulo, 20 de fevereiro de 2006, p. A2 revela intolerância e burrice extremas: a decisão tomada pela Suprema Corte americana em 1987 no estado da Louisiana não permite que se tente mais “proibir o ensino da evolução” nos Estados Unidos. O gancho ilude os leitores da FSP sobre a atual realidade americana e o que realmente é a Teoria do Design Inteligente (TDI).
Se instado sobre qual é a tese desenvolvida por Michael Behe em “A Caixa Preta de Darwin” (Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998) http://www.zahar.com.br e qual é a tese formulada por William Dembski em “The Design Inference” (Cambridge: Cambridge University Press, 2001) http://www.cup.org Sayad não saberia responder. Por quê? Porque, como a maioria dos críticos da TDI, Sayad nunca os leu nem lidou com suas teses científicas. Aqui fica identificada a ignorância do ex-ministro sobre o assunto e o seu editorial ideológica e matreiramente enviesado.
Ele que lida com números está muito mais capacitado do que nós mortais a fazer uma auditoria contábil e até dirigir o Brasil, se quiser para o desastre ou sucesso econômico, mas uma ‘auditoria epistemológica’ das insuficiências epistêmicas das atuais teorias da origem e evolução da vida, Sayad não tem competência, tem apenas uma opinião infundada e superficial. Não passaria na matéria “Evolução 101”, pois seria reprovado ‘magna cum laude’.
O Discovery Institute http://www.discovery.org há muito tempo se manifestou contra a obrigatoriedade do ensino da TDI nas escolas públicas americanas, mas favorece que a evolução seja honesta e objetivamente ensinada com as evidências a favor e contra o FATO da evolução sendo debatidas em salas de aulas. É falso que nos Estados Unidos estejam exigindo “que se apresente a teoria do ‘intelligent designer’, um projetista (Deus?) que explicaria o sentido da evolução” nas escolas públicas.
Vamos por parte para iluminar a ignorância científica e factual do ex-ministro Sayad. Em primeiro lugar, a teoria não é do ‘intelligent designer’, mas do ‘intelligent design’. Em segundo lugar, a TDI como teoria científica limita-se unicamente a certos eventos do universo e da complexidade e diversidade da vida serem melhor explicados por ‘causas inteligentes’ e que essas causas são empiricamente detectadas. Os teóricos e proponentes da TDI não nos ocupamos da ontologia do ‘designer’, mas de sinais de inteligência (que parece faltou ao ex-ministro na elaboração deste editorial). Uma teoria que se propõe científica não pode jamais provar a existência e inexistência de um ente sobrenatural.
Quanto à vida fazer ou não sentido, o ex-ministro ‘escorregou’ no campo da valoração ético-filosófica pensando que estava fazendo ciência. A ciência não pode emitir juízos de valores. Isso fica exclusivamente para a filosofia, a ética e as tradições religiosas.
A controvérsia sobre a suficiência epistêmica da Teoria Geral da Evolução [TGE] (será que o ex-ministro Sayad sabe o que é isso? Creio que não!) não se dá unicamente ‘em alguns Estados americanos do Sudoeste e do Sul’, mas hoje intramuros na Academia (o ex-ministro tem andado por lá? Parece que não!) e nas principais publicações científicas (Tem lido sobre o assunto? Afirmo categoricamente que não!). Sayad não ‘ouviu o outro lado’ e nem sabe o que são as fundamentais insuficiências epistêmicas dessas teorias porque lê somente sobre a TGE o que é veiculado pela Grande Mídia atrelada à camisa de força da Nomenklatura científica: Darwin dixit, causa scientia finita!
Mirabolante e estapafúrdia a lógica do ex-ministro em considerar o ‘pragmatismo americano’ e o ‘pragmatismo tupiniquim’ em relação à verdade. Ele afirma que ‘não precisamos conviver com verdades rígidas’, mas o seu editorial é de uma ‘veritas’ engessada. Ou dá ou desce! Ao contrário do afirmado pelo ex-ministro do Planejamento, a verdade em nossa taba tupiniquim não ‘é menos nítida’, e tampouco ‘convive bem com contradições’. Desafio o ex-ministro a abandonar o discurso da tribo ultradarwinista fundamentalista (seria uma atitude corajosa de um autêntico contestador, pois ele quebraria o feitiço da ‘síndrome do soldadinho de chumbo’ dos intelectuais enfeitiçados) e ouse desafiar a Nomenklatura científica no seu ídolo maior: Darwin. Sayad seria prontamente defenestrado de seu status intelectual e enviado para o Gulag ideológico da Sibéria para ser reeducado intelectualmente. Como Moloque, Darwin-ídolo também recebe oferendas e sacrifícios humanos.
O ex-ministro Sayad perdeu uma boa oportunidade de auditar publicamente a ‘economia da insuficiência epistêmica do darwinismo’ e verificar que nos seus livros rotos de quase 150 anos existem muitos furos, fraudes e muitas notas promissórias epistêmicas que nunca serão resgatadas empiricamente pela ‘scientia qua scientia’.
A indiferença tupiniquim para com a verdade (não precisa ser rígida, basta apenas ser ‘veritas’) é a causa de sermos o que somos: um país de papagaios que não ousam discordar das opiniões grupais que Nelson Ascher, no mesmo dia e na mesma FSP sintetizou e descreveu tão bem no seu artigo “O jeans da intelectualidade”, p. E10.
Só que o jeans da intelectualidade ultradarwinista do ex-ministro está roto e para mais nada serve, a não ser ser jogado na lata do lixo da História da Ciência.