Eu já postei aqui o artigo How the Microbial World Saved Evolution from the Scylla of Molecular Biology and the Charybdis of the Modern Synthesis, de Carl Woese e Nigel Goldenfeld, publicado no Microbiology and Molecular Biology Reviews, mas não pude fazer considerações pertinentes ao artigo.
Chamo a atenção para o título com forte teor mitológico: Cila e Caríbdis. O primeiro é um rochedo e o segundo um temível turbilhão no estreito de Messina (Sicília, Itália). Os antigos navegantes que escapavam de Caríbdis, iam bater contra o rochedo de Cila. Traduzindo em graúdos: fugir de um perigo para cair em outro. Traduzindo em miúdos: se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come! Não sei o que passou pela cabeça de Woese e Goldenfeld de mencionar mitologia num artigo científico. Mitologia darwiniana???
Gente, eu não tenho mais tempo para elaborar textos sobre as implicações de determinados artigos ou pesquisas neste blog. Nem sei como não comentei mais detalhadamente este aqui tão emblemático da crise epistêmica pela qual passa a Síntese Evolutiva Moderna. Até alguns darwinistas ortodoxos reconhecem que esta teoria já morreu desde 1980, que a Síntese Evolutiva Ampliada vem aí [2010], mas a Nomenklatura científica continua muda como um bloco de mármore de Carrara. A Grande Mídia então, segue muda como assoalho.
Eu vou destacar aqui [sobre os ombros de um gigante] o que Woese e Goldenfeld salientaram. Para começar, eles usaram uma citação de Oppenheimer que deve ter incomodado muito a Nomenklatura científica:
“There must be no barriers for freedom of inquiry. There is no place for dogma in science. The scientist is free, and must be free to ask any question, to doubt any assertion, to seek for any evidence, to correct any errors.”
[Não deve haver barreiras para a liberdade de inquirição. Não há lugar para dogma na ciência. Os cientistas são livres, e devem ser livres para fazer qualquer pergunta, de duvidar qualquer afirmação, de buscar qualquer evidência, e de corrigir quaisquer erros. —J. Robert Oppenheimer, The Open Mind, p. 114 (1955).]
Os autores iniciaram seu artigo com este parágrafo desconcertante:
“This is the story of how biology of the 20th century neglected and otherwise mishandled the study of what is arguably the most important problem in all of science: the nature of the evolutionary process. This problem has suffered the indignity of being dismissed as unimportant to a basic understanding of biology by molecular biology; it went effectively unrecognized by a microbiology still in the throes of trying to find itself; and it became the private domain of a quasi-scientific movement, who secreted it away in a morass of petty scholasticism, effectively disguising the fact that their primary concern with it was ideological, not scientific.”
[Esta é a história da como a biologia do século 20 negligenciou e, quanto ao mais, conduziu mal [SIC ULTRA PLUS 1] o estudo do que, inquestionavelmente, é o problema mais importante em toda a ciência: a natureza dos processos evolucionários. Esse problema sofreu a indignidade de ser rejeitado seriamente como insignificante para o entendimento básico de biologia pela biologia molecular; ele passou efetivamente desapercebido por uma microbiologia ainda lutando para achar a si mesma; e se tornou o domínio privado de um movimento quase científico [SIC ULTRA PLUS 2], que o escondeu em um pântano de escolasticismo banal, efetivamente disfarçando o fato que a principal preocupação deles com o problema foi ideológica e não científico].
Bem, logo em seguida Woese e Goldenfeld escreveram sobre as quatro descobertas que foram suprimidas [SIC ULTRA PLUS 3] tão-somente porque elas ‘dessacralizavam’ o dogma darwinista:
1) Todos os organismos unicelulares NÃO descendem de bactérias.
“All these organisms share the distinctive structural properties associated with the procaryotic cell... and we can therefore safely infer a common origin for the whole group in the remote evolutionary past.” (1962) This dogmatic approach to the essence of microbiology would shunt development away from the problem of the nature of cellular organization, which Stanier and van Niel had solved by fiat… Stanier and van Niel’s assertion that all bacteria were prokaryotes was an eminent testable hypothesis — the only problem being that neither the authors nor microbiologists in general perceived it that way.”
[Todos estes organismos partilham de propriedades estruturais distintivas associadas com a célula procariótica... e, portanto, nós podemos inferir seguramente uma origem comum para todo o grupo no passado evolucionário remoto.” (1962) Esta abordagem dogmática da essência da microbiologia poria de lado o desenvolvimento do problema da natureza da organização celular, que Stanier e van Niel resolveram de estalo… A afirmação de Stanier e van Niel de que todas as bactérias eram procariotas foi uma eminente hipótese testável — sendo o único problema que nem os autores e nem os microbiologistas em geral a perceberam assim. [SIC ULTRA PLUS 4: há gente que não consegue ‘perceber’ o design empiricamente detectado na natureza...]
2) A microbiologia NÃO é apenas química dentro de uma membrana — reducionismo.
“It is difficult to imagine that the discipline which defined biology in the last century — that taugh us so much and provided such benefit to the ambient society — is fundamentally flawed. But that is the case. Molecular biology expressly established itself within the (classical) Newtonian worldview. As such, its perspective was fundamentally reductionist. In other words, all things were explainable, completely and solely, as the sum of their various parts — which also meant that they could (in principle) be predicted a priori… It is one thing to hold a perspective in principle, another to apply it in detail.
Thus, in the early decades of the 20th century, molecular biology’s fundamental reductionist perspective was innocuous — especially when there were many problems that could benefit from a (simple) reductionist approach. It was another thing altogether when molecular biology began reconceptualizing biology in an exclusively reductionist fashion. Then the inadequacies of reductionist metaphysics began to show. The major wrong turn in biology’s course was its conceptualization and subsequent handling of the problem of the gene. It would come to a point where the discipline had to choose between the obvious biology of the situation and the tenets of reductionism. Molecularists choose the later, thereby taking off the table a major biological question…
This turn in the road (of applying reductionist metaphysics to the understanding of the biological world) would become a superhighway that dead-endd before it reached molecular biology’s ultimate goal, that of understanding the essence of ‘livingness’ and directly answering the question of how molecules come to life.”
[É difícil imaginar que a disciplina que definiu a biologia no último século — que nos ensinou tanto e forneceu tal benefício para o ambiente da sociedade — esteja fundamentalmente errada. [SIC ULTRA PLUS 5: Gould disse em 1980 que a Síntese Evolutiva Moderna estava morta, mas que teimava ser ortodoxia somente nos livros didáticos de Biologia do ensino médio]. Mas este é o caso. A biologia molecular se estabeleceu expressamente dentro da cosmovisão (clássica) newtoniana. Como tal, sua perspectiva era fundamentalmente reducionista. Em outras palavras, todas as coisas eram explicáveis, completamente e somente, como a soma de suas várias partes — o que também significava que elas podiam (em princípio) serem preditas a priori... Uma coisa é defender uma perspective em princípio, outra coisa é aplica-la em detalhe.
Assim, nas primeiras décadas do século 20, a perspectiva fundamental da biologia molecular era inócua — especialmente quando havia muitos problemas que podiam beneficiar de uma (simples) abordagem reducionista. Também foi outra coisa quando a biologia molecular começou a reconceituar a biologia num modo exclusivamente reducionista. Então as inadequações da metafísica reducionista começaram a aparecer. A maior virada errada no curso da biologia foi a sua conceituação e o modo subsequente de lidar o problema do gene. Chegou a um ponto onde a disciplina teve que escolher entre a biologia óbvia da situação e os princípios do reducionismo. Os molecularistas escolheram os últimos, tirando assim da mesa uma questão biológica importante…
Esta virada na estrada (de aplicar a metafísica reducionista na compreensão do mundo biológico) [SIC ULTRA PLUS 6: METAFÍSICA!!!] se tornaria a rodovia que terminou sem saída antes de alcançar o objetivo último da biologia, o de compreender a essência da ‘estar vivo’ e responder diretamente a pergunta de como as moléculas passaram a viver.”]
3) O modelo [???] da síntese evolutiva moderna NÃO é o verdadeiro processo evolucionário.
“We have seen that molecular biology, the dominant biological discipline of the time, did not even recognize the evolutionary process as a scientific problem. Given its overview (axiomatic assumptions), molecular biology took evolution simply as biological epiphenomenology, “historical accident” — which means that evolutionary considerations have no bearing whatsoever on any fundamental understanding of living systems…
The modern evolutionary synthesis should have been the 20th century’s evolutionary bastion, the forefront of research into the evolutionary process. No such luck!
The basic understanding of evolution, considered as a process, did not advance at all under its tutelage. The presumed fundamental explanation of the evolutionary process, “natural selection,” went unchanged and unchallenged from one end of the 20th century to the other.
Was this because there was nothing more to understand about the nature of the evolutionary process? Hardly! Instead, the focus was not the study of the evolutionary process so much as the care and tending of the modern synthesis. Safeguarding an old concept, protecting “truths too fragile to bear translation” is scientific anathema.”
[Nós vimos que a biologia molecular, a disciplina dominante do tempo, nem sequer reconheceu o processo evolucionário como um problema científico. Considerando-se o seu resumo (pressuposições axiomáticas) [SIC ULTRA PLUS 7], a biologia molecular considerou a evolução simplesmente como epifenomenologia [SIC ULTRA PLUS 8], “acidente histórico” — o que significa dizer que as considerações evolucionárias não têm relação nenhuma sobre qualquer entendimento fundamental dos sistemas vivos… [SIC ULTRA PLUS 9: e o que fazer do mantra dobzhanskyano — nada em biologia faz sentido a não ser à luz da evolução???]
A síntese evolutiva moderna deveria ter sido o bastião da evolução do século 20, a vanguarda de pesquisa no processo evolucionário. Não teve esta sorte! [SIC ULTRA PLUS 10: desde quando se faz ciência num vazio epistêmico? A ciência aborrece o vazio epistemológico...]
O entendimento básico da evolução, considerado como um processo, não avançou de modo algum sob sua tutela. [SIC ULTRA PLUS 11: e os milhões de reais (ou dólares) que foram gastos em pesquisas evolutivas significa que os cientistas correram atrás de vento??? Vamos pedir nosso suado dinheirinho de volta???] A explicação fundamental presumida do processo evolucionário, a “seleção natural”, não mudou e nem foi desafiada de uma extremidade do século 20 para a outra.
Isso se deu por que não havia nada mais para se entender sobre a natureza do processo evolucionário? Dificilmente! Em vez disso, to foco não foi o estudo do processo evolucionário tanto quanto foi o cuidado e o tomar conta da síntese moderna. Salvaguardar um velho conceito, proteger “verdades por demais frágeis para suportar a tradução” é anátema científico] [SIC ULTRA PLUS 12: Isso não é ciência, é IDEOLOGIA!]
4) Os genes herdados (e melhorados) NÃO são tão fundamentais para os processos evolucionários quanto a transferência horizontal de genes.
“Dogmatic thinking has prevailed all too often in our account, with disastrous consequences for the progress of the fields of microbiology, molecular biology, and the study of the evolutionary process. It led to the stagnant and scientifically invalid notion of the prokaryote; it led to the redefinition of the problem of the gene; and through a slavish adherence to the modern evolutionary synthesis, it led to a premature declaration of victory in the
struggle to understand the evolutionary process.
Today, we know that horizontal gene transfer is a powerful evolutionary force in the microbial world, well-documented in the phylogenetic record, and one whose ecological significance is only beginning to be fully understood. Spurred on by advances in genomic technology, microbial ecology is presenting new insights into the workings of the biosphere, demanding a synthesis with the evolutionary process, and forcing evolutionary biology to pay attention. The power of horizontal gene transfer is so great that it is a major puzzle to understand why it would be that the eukaryotic world would turn its back on such a wonderful source of genetic novelty and innovation.
The exciting answer, bursting through decades of dogmatic prejudice, is that it hasn’t. There are now compelling documentations of horizontal gene transfer in eukaryotes, not only in plants, protists, and fungi, but in animals (including mammals) as well. The evolutionary implications have not yet been worked out, but we are confident that a fully worked out theory of the evolutionary process is required in order to properly meet the challenges posed initially by microbiology.”
[O pensamento dogmático tem prevalecido mui frequentemente em nosso relato, com consequências desastrosas para o progresso das áreas de microbiologia, biologia molecular, e o estudo do processo evolucionário. O pensamento dogmático resultou na noção cientificamente estagnada e inválida do procarioto; na redefinição do problema do gene; e através de uma adesão escravagista [SIC ULTRA PLUS 13: É proibido pensar livremente entre os darwinistas!] à síntese evolutiva moderna, isso resultou numa declaração prematura de vitória na luta para se entender o processo evolucionário [SIC ULTRA PLUS 14: desde 1859 dizem que o fato, Fato, FATO da evolução é um fato científico tão certo quanto a lei da gravidade. Maçãs continuam caindo, mas eu ainda não vi e nem verei um Australopithecus afarensis se transformar em antropólogo amazonense...]
Hoje, nós sabemos que a transferência horizontal de gene é uma força evolucionária poderosa no mundo microbiano, bem documentada no registro filogenético, e um cuja significância ecológica está somente começando a ser completamente entendida. Estimulado pelos avanços na tecnologia genômica, a ecologia microbiana está apresentando novos insights no funcionamento da biosfera, exigindo uma síntese com o processo evolucionário, e forçando a biologia evolucionária prestar atenção. O poder da transferência horizontal de gene é tão grande que é um quebra-cabeça importante para entender porque o mundo eucariótico daria suas costas para uma fonte maravilhosa de novidade e de inovação genética.
A resposta emocionante, irrompendo através de décadas de preconceito dogmático, é que ela não irrompeu. Agora existem documentações convincentes de transferência horizontal de gene em eucariotos, não somente em plantas, protistas, e fungos, mas também em animais (inclusive mamíferos). As implicações evolucionárias ainda não foram produzidas, mas nós estamos confiantes que uma teoria bem elaborada do processo evolucionário se faz necessária a fim de enfrentar adequadamente os desafios colocados inicialmente pela microbiologia.] [SIC ULTRA PLUS 15: Que venga la nueva teoría de evolución: a Síntese Evolutiva Ampliada, que não pode ser selecionista!!!]
[SIC ULTRA PLUS 16: Traduzindo em miudinhos, a ciência perdeu um século de ciência molecular por causa do dogma darwinista. [NOTA BENE: UM SÉCULO!] E isso não se aplica somente à microbiologia: nós podemos incluir aqui todas as demais sub-áreas de biologia que foram estropiadas pelo dogma. E ainda têm a cara de pau de dizer que a turma do Design Inteligente é que impede o avanço da ciência...]
Pensando em péssimos timoneiro, oops 'guias' em biologia, Lysenko, você está redimido, mas a turma da Síntese Evolutiva Moderna, vai pros quintos do inferno epistêmico.
Ué, cadê e a MONTANHA DE EVIDÊNCIAS a favor do fato, Fato, FATO da evolução? O gato das evidências comeu!
Fui, nem sei por que, pensando, mas Darwin vai ter que contar outra...
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NOTA CAUSTICANTE DESTE BLOGGER:
Eu, se fosse darwinista ortodoxo, fundamentalista, xiita, pós-moderno, perfumado e chique a la Dawkins, depois deste artigo do Woese e Goldenfeld, enfiava no saco a viola do fato, Fato, FATO da evolução, e e não mais debateria publicamente a robustez da teoria geral da evolução. O contexto da justificação teórica diz que ela não passa pelos seus testes rigorosos.
Mas para fazer isso, é preciso ter ‘cojones’, artigo evolutivo em falta nesses dias da Konsensus Akademia...