Um passo além: a formulação da teoria que atualizou Darwin

quinta-feira, maio 21, 2009

Um passo além: a formulação da teoria que atualizou Darwin

Teoria sintética da evolução incorporou conhecimentos vindos da Genética, da Paleontologia e da Bioquímica

Com o passar do tempo, o conhecimento científico tende a se aprimorar, novas descobertas são feitas, algumas teorias são unificadas, outras se desintegram, umas entram na moda, outras malogram. Não foi diferente com a teoria de Darwin sobre a evolução das espécies. Com o correr dos anos, novos cientistas, com diferentes estudos, foram agregando informações às ideias lançadas em 1859, no revolucionário "A Origem das Espécies", o que levou ao surgimento, na primeira metade do século XX, de uma formulação moderna para os estudos evolutivos - a chamada teoria sintética da evolução, ou simplesmente neodarwinismo.

A teoria sintética considera, principalmente, conhecimentos adquiridos depois de Darwin nas áreas da hereditariedade, da genética clássica e da genética de populações.

"Objetivamente, a teoria sintética da evolução é uma atualização da teoria da evolução darwiniana, que leva em consideração certos fatores desconhecidos por Darwin", explica Francisco Prosdocimi, geneticista do Laboratoire de Biologie et Genomique Structurales, de Strasbourg, na França. "A diferença é que a teoria sintética considera, principalmente, conhecimentos adquiridos depois de Darwin nas áreas da hereditariedade, da genética clássica e da genética de populações", afirma ele.

Apesar de ser considerada fundamentalmente uma atualização da teoria evolucionista, a teoria sintética trouxe algumas modificações conceituais para os estudos sobre evolução.

Prosdocimi destaca algumas alterações no pensamento que são importantes na passagem de uma teoria para outra. Primeiramente, ele cita a rejeição de August Weissmann à teoria da herança dos caracteres adquiridos, ainda no século XIX. A teoria da herança dos caracteres adquiridos afirmava por exemplo que, se alguém fizer muita musculação ao longo da vida, seu filho já vai nascer forte. Tal teoria é um dos principais pontos que diferencia a evolução lamarckista (de Jean-Baptiste Lamarck, naturalista francês) em comparação com a evolução darwiniana. Entretanto, mesmo Darwin chegava a propor, em algumas partes de "A origem das espécies", a evolução através de caracteres adquiridos. Foi apenas com Weissmann - fazendo experimentos clássicos como cortar o rabo de roedores e verificar se a prole nascia sem rabo, dentre outros - que a teoria foi finalmente refutada.

Em seguida, veio a redescoberta, no início do século XX, dos trabalhos do monge Gregor Mendel, considerado o "pai da genética". "Os trabalhos de Mendel ficaram esquecidos porque eles jamais foram publicados em Inglês e, portanto, não chegaram até os grandes evolucionistas do mundo. Apenas quando foram traduzidos, por volta de 1900, é que se diz que eles foram redescobertos. A abordagem mendeliana permitiu que os darwinistas conseguissem explicar a evolução por meio de herança", conta Prosdocimi.

Por fim, a síntese dos conhecimentos dos zoólogos e dos geneticistas de população sob uma ótica darwiniana contribuiu para aprimorar a observação das espécies. "Os zoólogos sempre estiveram interessados na diferenciação entre as espécies e mecanismos de especiação, enquanto os geneticistas de populações estiveram interessados na evolução dentro de uma mesma linhagem", diz o pesquisador do laboratório francês. Juntos, zoólogos e geneticistas reuniram evidências empíricas para ampliar o horizonte explicativo de Darwin. Nesse sentido, Ernst Mayr, em seu livro "One Long Argument: Charles Darwin and The Genesis of Modern Evolutionary Thought" (Um grande argumento: Charles Darwin e a gênese do moderno pensamento evolucionário, Editora da Universidade de Harvard, 1993), considera que a principal realização da teoria sintética foi desenvolver uma visão unificada sobre a natureza da mudança genética.

Evidenciando o contraste

Com o aprimoramento e a atualização das idéias de Darwin, algumas diferenças se fizeram presentes entre o pensamento original e a "nova" teoria que surgiu. As discrepâncias importantes entre a teoria sintética da evolução e a teoria de Darwin podem ser resumidas da seguinte forma: a teoria sintética admite a mudança genética aleatória como um mecanismo da evolução importante, juntamente com o mecanismo da seleção natural; assume que os caracteres são herdados através dos genes e que as variações da população devem-se à presença de múltiplas variações de um gene; e, finalmente, supõe que a especiação se deve, normalmente, a pequenas mudanças aleatórias na informação genética.

Já a teoria clássica também sabia que fatores aleatórios estavam envolvidos na forma como as mutações aconteciam, mas Darwin ainda tinha uma veia herdada de Lamarck, e chegou a argumentar em favor da herança de caracteres adquiridos como fonte da variação entre os indivíduos. Em relação à herança genética, ele não conseguiu explicar a transmissão específica de certas informações, como cor do cabelo e dos olhos, ao longo das gerações, como foi possível pós-Mendel. E no que diz respeito à especiação, Darwin considerava a separação geográfica como a chave desse processo. "Estando em diferentes ambientes, há diferentes fatores mutagênicos e fatores aleatórios que mudam o DNA de uma forma específica numa e noutra população. Além disso, as mudanças seriam filtradas pelo mecanismo de seleção natural, que define os indivíduos mais ou menos adaptados", explica Prosdocimi.

"Na verdade, essas diferenças são resultado do enriquecimento do darwinismo, que incorporou uma série de outros conhecimentos vindos da Paleontologia e da Bioquímica. E esta é a magia da Ciência: progredir sempre, pois o dia em que parar de progredir deixa de ser Ciência, tendo em vista que os modelos científicos podem ser cada vez melhores à medida que se descobrem coisas novas", afirma Marco Del Lama, professor do Departamento de Genética e Evolução da Universidade Federal de São Carlos.
Portanto, numa combinação da teoria de evolução das espécies por meio de seleção natural com a herança genética e a genética populacional, a teoria sintética modernizou o darwinismo e, depois dela, ainda houve uma nova revolução trazida pela descoberta da estrutura molecular da vida, o código genético e o sequenciamento de genomas.

Os pilares da Teoria Sintética

O neodarwinismo baseia-se em cinco processos básicos da evolução: mutação, recombinação genética, seleção natural, migração e oscilação genética.

Mutação: alteração na sequência de bases nitrogenadas de um determinado gene, durante a duplicação da molécula de DNA. As mutações gênicas são consideradas as fontes primárias da variabilidade, e elas ocorrem ao acaso.

Recombinação genética: enquanto a mutação é a fonte fundamental da variação genética, pois é através dela que são formados genes "novos", a recombinação é um mecanismo que reorganiza os genes já existentes nos cromossomos. O mecanismo primário de recombinação genética é a reprodução sexuada.

Seleção natural: consiste na seleção de genótipos mais bem adaptados a uma determinada condição ecológica, eliminando aqueles desvantajosos para essa mesma condição.

Migração: corresponde à entrada ou saída de indivíduos de um determinado território. Através dos processos migratórios há a possibilidade de serem introduzidos genes novos em uma população.

Oscilação genética: ocorre apenas em populações pequenas. Significa que qualquer alteração ao acaso pode produzir alterações na frequência genotípica. Um caso de oscilação genética é o denominado princípio do fundador, que se refere ao estabelecimento de uma nova população a partir de poucos indivíduos que emigram da população original. Esses indivíduos serão portadores de pequena fração da variação genética da população de origem e seus descendentes apresentarão apenas essa variabilidade, até que genes novos ocorram por mutação.

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Fonte.