Interessante a pesquisa de Rogerio Meneghini, Abel Packer e Lilian Nassi-Calò, da Bireme, a ser publicada brevemente no “PLOS One” sobre a questão da publicação de artigos e pesquisas em publicações científicas com um “fator de impacto” prestigiado como a Nature, Science, Cell entre outras.
Segundo os autores, não com estas palavras, é claro, é o famoso “jeitinho brasileiro”. O sofisticado “QI” [Quem Indica] que abre as portas do Olimpo da Nomenklatura científica, y otras cositas mais.
Marcelo Leite, da Folha de São Paulo, que eu saiba, nunca abordou outro fenômeno ligado à revisão por pares [peer-reviewing é mais chique], onde os revisores agem como guardas-cancelas garantindo a “ortodoxia” do paradigma consensual, impedindo a publicação de artigos e pesquisas contrariando a visão consensual da Nomenklatura científica. Quer coisa mais medieval do que isso? E eles arrotam objetividade e “conhecimento científico”.
Apesar de o darwinismo estar sofrendo dores de parto de uma nova teoria evolutiva [Síntese Evolutiva Ampliada, que não será selecionista], ai de quem ousar mijar fora do caco epistêmico do guru de Down, o homem que teve a maior idéia que toda a humanidade já teve e que, como ácido, corrói a tudo [Dennett, este guri é mesmo incorrigível, fica quieto!]. Não publica, e ainda corre o risco de ter a sua carreira acadêmica destruída. Sei do que estou falando.
A Nomenklatura científica é antropofágica par excellence! Sei do que estou falando, pessoalmente. O “fator QI” é muito importante para a manutenção da ortodoxia do paradigma, mas é uma forma castradora de novas idéias e teorias científicas.
Vade retro, “guardas-cancelas”, oops revisores por pares [peer-reviewers é mais chique]. Sem vocês, Darwin estaria perdido... Mas o bom em ciência é que um dia a verdade das evidências prevalece sobre as preferências ideológicas dos mandarins de plantão. É a chamada estrutura das revoluções científicas = mudança paradigmática, duela a quien duela! Não é mesmo, Kuhn?
Eu estou pensando seriamente escrever alguns artigos, participar de mais conferências, apresentar pôsters. De preferência na SBPC. Será que a KGB de Down vai permitir que eu, sem “QID” [Quem Indica Darwin] faça isso? Duvido, mas vou tentar.
Ué, eu pensei que em ciência, mano, fosse tudo somente questão de “QED” [Quod erat demonstrandum] e não de “QID”. O QED involuiu em QID???
Fui, nem sei porque, pensando em Fernando Pessoa: “Na vida tudo vale a pena, quando a alma não é pequena”.
Quem está na chuva é pra se queimar. Quem viver, verá!
+++++
+Marcelo Leite
Favor de impacto
Cientistas com colegas em país rico estão mais perto do sucesso
Esta coluna trata do que os pesquisadores chamam de "fator de impacto" e... não, não há erro de digitação no título. Como de hábito neste país, e como será argumentado aqui, os brasileiros também dependem de favores especiais para subir na vida dos laboratórios. A receita do sucesso parece ser pegar uma carona com pesquisadores de países ricos. É o que sugere um levantamento de Rogerio Meneghini, Abel Packer e Lilian Nassi-Calò, da Bireme, respeitado centro de estudos da Organização Pan-Americana de Saúde em São Paulo. O estudo será publicado em breve no periódico "PLoS One".
Antes, uma explicação. Fator de impacto é uma medida usual da repercussão alcançada por periódicos científicos. Parte do princípio de que um bom estudo, ao ser publicado na forma de artigo, receberá mais citações em trabalhos de outros autores do que um mau estudo. O periódico que tiver mais e melhores artigos, por extensão, gerará a maior quantidade de citações. Obtém-se o fator de impacto de uma publicação dividindo o total de citações surgidas num período pelo número de artigos editados no período anterior.
O indicador permite comparar o prestígio dos periódicos uns com os outros. Compõe um referencial importante para o pesquisador decidir onde gostaria de ver seu trabalho publicado. Na busca por reconhecimento e por verbas de pesquisa, cientistas fazem das tripas coração para ter um trabalho aceito por campeões editoriais como "Nature", "Science" e "Cell". São revistas internacionais com fator de impacto na casa de 30 citações por artigo.
Há muito se suspeita de que pesquisadores de nações periféricas sejam prejudicados nesse troca-troca de citações. Seus artigos tenderiam a ser menos lidos e, segundo a hipótese, incluídos de modo menos freqüente nas listas de referências dos colegas dos países desenvolvidos. Um protecionismo acadêmico, por assim dizer.
Meneghini, Packer e Nassi-Calò tomaram por base um acervo de 1.244 textos publicados em 2004 e 2005 com autores de quatro países latino-americanos (Argentina, Brasil, Chile e México) em sete periódicos internacionais de prestígio. E, claro, as citações que receberam no ano subseqüente (2006).
Para comparação, montaram outro banco de dados sobre mais de 44 mil trabalhos com autores de cinco países ricos (Alemanha, Estados Unidos, França, Japão e Reino Unido). Em seguida, separam ambas as amostras em dois subconjuntos menores: um com artigos assinados por autores de um mesmo país, sem colaboração internacional, e outro com.
Resultou o previsível (mas boa parte da ciência serve para isso mesmo, confirmar e apoiar em números objetivos aquilo que já se sabe).
Estatisticamente, tanto faz para autores de países desenvolvidos publicar com ou sem colaboradores estrangeiros -serão citados em proporção semelhante e muito próxima do fator de impacto da publicação.
No caso latino-americano, a desvantagem é enorme. Artigos sem apoio de colegas desenvolvidos têm fatores de impacto 34% menores que a média. Com colaboração internacional, se aproximam do usual na publicação. Resta estabelecer se os trabalhos de latino-americanos são menos citados só porque são ruins, o menos provável, ou se os pesquisadores de países ricos é que não se dão ao trabalho de lê-los. Muitos latino-americanos já concluíram, bingo, que o caminho das pedras exige o favor de um co-autor bacana.
MARCELO LEITE é autor de "Ciência - Use com Cuidado" (Editora da Unicamp, 2008) e de "Brasil, Paisagens Naturais - Espaço, Sociedade e Biodiversidade nos Grandes Biomas Brasileiros" (Editora Ática, 2007).
Blog: Ciência em Dia.
E-mail: cienciaemdia.folha@uol.com.br