Eu sou suspeito para replicar o artigo “Santa aliança”, de Reinaldo José Lopes, publicado hoje (07/03) na Folha de São Paulo, sobre suposta união de forças entre criacionistas e negacionistas da mudança climática com a adoção de estratégia e discurso parecido:
Primeiro, a FSP defende ardorosamente o aquecimento global como sendo antropogenicamente causado e inocenta a atitude criminosa dos cientistas do IPCC que sonegaram e distorceram informações científicas, e perseguiram críticos e oponentes.
Em segundo lugar, Marcelo Leite ("Não damos espaço") até que mudou o tom, e pediu a cabeça de Pachauri no IPCC, mas não pediu que ele e Al Gore devolvessem as medalhas e o dinheiro (quase R$ 2 milhões) que ganharam pelo prêmio Nobel da Paz em 2007.
Para mim, este jornal já perdeu sua credibilidade como jornal há uma década: não pratica o jornalismo moderno proposto em seu Manual de Redação, não dá espaço para os críticos, e não ouve o outro lado. Aliás, quando ouve, como é o caso deste artigo de Lopes, a FSP sempre ‘demoniza’ o outro lado.
O artigo de Lopes é para ser lido cum grano salis. Será que é isso mesmo que a FSP quer que seus leitores fiquem sabendo e creiam a respeito de uma questão científica extremamente importante? Qual é a agenda espúria de Leite com este artigo? Eu vou soar bem cínico e irônico aqui, mas eu não acredito em nenhuma linha escrita pelos jornalistas da FSP quando a questão é Darwin ou o aquecimento global ser antropogenicamente provocado. É tutti cosa nostra, capice?
Lopes afirmou haver uma convergência parcial de interesses entre criacionistas e céticos do clima, e os membros do Discovery Institute. O que o jornalista da FSP deixou de mencionar é a analogia que fazemos do modo como os céticos e críticos do aquecimento global ser antropogenicamente provocado são perseguidos e destratados academicamente, é o mesmo que acontece com os teóricos e proponentes da teoria do Design Inteligente.
Além disso, Lopes afirmou mal intencionadamente ser o design inteligente uma ‘versão repaginada do criacionismo’. Ele sabe que a TDI não é criacionismo repaginado, pois o nosso referencial teórico minimalista afirma que sinais de inteligência são empiricamente detectados na natureza todas as vezes que encontrarmos complexidade irredutível de sistemas bióticos e informação complexa especificada. E aceitamos alguns aspectos teóricos evolutivos. Onde o criacionismo, cara-pálida?
Ronald Numbers, ex-adventista, historiador de ciência, especialista renomado em criacionismo, e nada simpático às teses do DI, concorda que o rótulo de ‘criacionista’ é inexato para descrever o movimento do DI. Razão? A maioria dos proponentes do DI não é formada por cristãos fundamentalistas, alguns nem são cristãos, alguns são agnósticos e há até ateus. Por que alguns darwinistas como Lopes (teísta evolucionista, posição teórica incômoda entre os darwinistas e os de subjetividades religiosas) continuam tentando identificar o DI com o criacionismo? Segundo Numbers, é porque eles pensam que tais afirmações retóricas é “a maneira mais fácil de desacreditar o design inteligente.”
O artigo de Lopes foi escrito em Novilíngua (1984, de Orwell), e objetivou o seguinte:
1. Dividir e conquistar os céticos para a ortodoxia do aquecimento global e do darwinismo, que foram descritos como religiosos fundamentalistas ignorantes quando são cientistas com Ph. D. por renomadas universidade e membros de Academias de Ciências, na esperança de provocar um racha entre os de subjetividades religiosas que apoiam e defendem as teses do DI.
2. Dificultar mais ainda que órgãos científicos aqui no Brasil sejam encorajados a pensar criticamente sobre o aquecimento global do mesmo modo como o pensamento crítico da evolução tem sido resistido com unhas e dentes até pelas Academias de Ciências com seus manifestos panfletários apesar da montanha de evidências científicas contrárias.
Assim como Lopes teve a liberdade de fazer ilações sobre as ‘afinidades eletivas’ entre criacionistas e negacionistas do clima por causa da coincidência ideológica e social associados a grupos à direita de inspiração religiosa, eu vou fazer aqui uma ilação das ‘afinidades eletivas’ entre a Nomenklatura científica e a Grande Mídia: há coincidência ideológica e social associados a grupos à esquerda de inspiração ideológica de materialismo filosófico pós-moderno, chique e perfumado a la Dawkins.
Além disso, no artigo Climate Scientists Plan to Hit Back at Skeptics [Cientistas do clima planejam revidar os céticos], Paul R. Ehrlich, pesquisador do clima da Universidade Stanford, em e-mail citado neste pequeno artigo, traduz muito bem estas ‘afinidades eletivas’ entre a Nomenklatura científica e a Grande Mídia, e a estratégia a ser adotada contra os céticos do aquecimento global ser antropogenicamente provocado:
“A maioria de nossos colegas parece que não percebe que nós não estamos em um debate entre pessoas gentis, nós estamos numa briga de rua contra inimigos impiedosos e muito bem financiados que jogam por regras completamente diferentes.”
Os céticos e críticos do aquecimento global ser antropogenicamente causado são, segundo a visão de Lopes, verdadeiros cruzados em uma santa aliança fundamentalista contra a ciência. Nada mais falso. Nós queremos o rigor da ciência para as hipóteses do aquecimento global ser unicamente provocado pela ação humana.
Digno de destaque é a frase de Ehrlich: ‘inimigos impiedosos’. Se você desafiar os dogmas científicos, você não é apenas ignorante, não sabe o que é e nem como se faz ciência, você é inimigo, e contra os inimigos da ciência vale tudo. Ehrlich que se cuide, pois esses inimigos não são impiedosos como ele afirmou, mas são extremamente competentes e articulados. Nós seguimos as evidências aonde elas forem dar. Ehrlich parece que não. Ele é a favor da estratégia de convencimento ad baculum... Troglodita!
Lopes não destacou em seu artigo que os teóricos e defensores do DI desafiam algumas posições darwinistas em bases estritamente científicas, e propomos a TDI como uma alternativa científica razoável. O que vemos aqui no artigo de Lopes (engraçado o New York Times lançou esta tese antes da FSP), é tentar enfiar no mesmo saco de negacionistas do aquecimento global antropogenicamente provocado, criacionistas e a turma do DI, quando a verdadeira pergunta que Lopes deveria fazer à turma do IPCC é: onde está a ciência do aquecimento global ser antropogenicamente provocado? Como testar as hipóteses em um contexto de justificação teórica? Y otras cositas mais. Ciência 'voodoo'? Mas Lopes não faz isso. Ele está de rabo preso com a Nomenklatura científica.
Será que Lopes não aprendeu a fazer jornalismo científico? Nunca passou pela cabeça dele que mais de 30.000 cientistas são negacionistas fazendo afirmações e baseando seu ceticismo e críticas apenas na ciência? Eu não quero dizer com isso que não haja interesses políticos, pois há, de alguns, dos dois lados. Contudo, Lopes não mencionou, mas sabe que Al Gore é dono de uma empresa que negocia créditos de carbono com as nações, e já faturou muitos milhões de dólares com isso. Não há nenhum interesse financeiro de Al ‘Apocalipse’ Gore? Me engana que eu gosto...
Lopes tentou ‘demonizar’ os céticos e negacionistas deixando de considerar as bases científicas legítimas de seu ceticismo e de suas críticas. O jornalista da FSP deveria ter fornecido a ciência do aquecimento global, mas em vez disso, ele preferiu intimidar os céticos, mesmo que cientificamente qualificados, e forçar todo mundo a aceitar o atual dogma científico preferido. Se isso virar moda no jornalismo científico, não há razão nenhuma para os leitores continuarem confiando nas afirmações feitas pelos cientistas em outros assuntos! Especialmente da FSP, um jornal que já teve o rabo preso com os leitores.
Um título melhor para o artigo de Lopes deveria ser: Aliança espúria cientificista contra os céticos científicos.
Fui, nem sei por que, pensando que, num passe de mágica, oops em um artigo de um jornalista científico de um jornal em decadência jornalística, eu e mais de 30.000 cientistas céticos do aquecimento global ser antropogenicamente provocado passamos de céticos a cruzados de uma infame santa aliança fundamentalista contra a ciência. Nada mais falso!
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NOTA DESTE BLOGGER:
Ah, ia me esquecendo, mas uma das fontes de Lopes, Joshua Rosenau, é do Centro Nacional para Educação Científica [NCSE], uma ONG dos EUA que defende o ensino unilateral da evolução sem críticas a Darwin, mesmo que científicas. Lopes não mencionou, mas Joseneau defende a existência de outras formas de conhecimento além da ciência: Of vampires and ways of knowing