Raio X da ciência na imprensa

quarta-feira, outubro 14, 2009

Raio X da ciência na imprensa

Monitoramento de 62 jornais ao longo de dois anos aponta desafios para cobertura da área no Brasil

Foram apresentados nesta terça-feira os resultados do mais abrangente monitoramento já feito sobre a cobertura de ciência, tecnologia e inovação na imprensa brasileira. O estudo analisou as notícias publicadas sobre esse tema em 62 jornais ao longo de dois anos. Os resultados permitiram traçar um diagnóstico de como a mídia brasileira cobre ciência e apontar as principais deficiências dessa cobertura e os desafios para aprimorá-la.


Capa do relatório Ciência, tecnologia e inovação na mídia brasileira, que apresenta os resultados preliminares do monitoramento das notícias sobre o tema publicadas ao longo de dois anos por 62 jornais diários.

O projeto foi realizado pela Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), vinculada à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em parceria com a Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi).

Os resultados foram avaliados em um workshop realizado em Belo Horizonte, com a presença de jornalistas e gestores da área de ciência, tecnologia e inovação. O documento será atualizado a partir das discussões realizadas durante o evento e publicado na forma de livro. Confira um sumário executivo e a versão completa do relatório discutido no workshop.

Para Luiz Guilherme Queiroz Gomes, consultor de comunicação social da Fundep, o estudo é importante porque alimenta a reflexão sobre a comunicação de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. “Esse monitoramento aponta onde temos falhado, para que lado precisamos avançar, quais temáticas precisam ganhar espaço e quais fontes precisam ser ouvidas”, avalia. “A partir dessa reflexão, podemos elaborar estratégias e recomendações que possam contribuir para avançarmos nessa área.” [Ênfase adicionada por este blogger]

Dois anos de ciência nos jornais

O estudo analisou vários parâmetros de uma amostra de 2.599 notícias publicadas em 2007 e 2008 nos 62 jornais usados no trabalho. As matérias foram selecionadas a partir de palavras-chave ligadas ao universo da ciência, tecnologia e inovação. A distribuição dessas notícias foi desigual: os quatro diários de abrangência nacional analisados publicaram um quarto das notícias monitoradas em 2008, com uma média de 2,3 notícias por dia – nos jornais regionais, a média foi de 0,6 por dia.

As ciências da saúde são a área com maior visibilidade, aparecendo com 28% das notícias analisadas, seguidas pelas ciências biológicas (21%) e pelas ciências exatas e da terra (18%). As ciências humanas e sociais aplicadas são as que tiveram menos espaço – juntas, elas respondem por menos de 18% dos textos.

O monitoramento apontou as principais fragilidades na cobertura dos temas analisados. A falta de contextualização das notícias é o calcanhar de Aquiles do jornalismo de ciência: cerca de 86% das notícias avaliadas apresentaram poucos ou nenhum elemento de contextualização que permitisse colocar o fato noticiado em perspectiva.

Da mesma forma, falta à cobertura da área apresentar as notícias sob uma maior pluralidade de pontos de vista. Mais da metade dos textos analisados (55%) foi feita a partir da consulta a uma única fonte. Além disso, apenas 13% dos textos analisados apontaram algum grau de incerteza na atividade científica, e as discussões éticas apareceram em apenas cerca de 12% dos textos.

Outro dado alarmante é a incapacidade do jornalismo de ciência de enxergar as grandes questões da ciência para além das pesquisas pontuais noticiadas. Os textos analisados no estudo se dedicavam na maior parte a noticiar estudos científicos ou avanços tecnológicos específicos; apenas 15% deles promoveram discussões sobre ciência de forma mais ampla. [Ênfase adicionada pelo blogger]

Demanda por qualificação

Para o secretário-executivo da Andi, Veet Vivarta, os resultados do monitoramento apontam a necessidade de se investir na formação dos jornalistas da área. “A boa notícia é que o espaço para pautas de ciência, tecnologia e inovação está dado e que há ótimos exemplos de cobertura de qualidade, mas ainda não são a média”, avalia. “Há uma demanda por capacitação e qualificação, e ela atinge não só as próprias redações, mas também as fontes de informação, que são o outro lado da notícia.” [Ênfase deste blogger]

Os resultados vão ajudar ainda a elaborar estratégias para aproximar os veículos da imprensa e o público. O diretor do Departamento de Difusão da Ciência do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Ildeu Moreira, analisou os resultados à luz de uma enquete sobre a percepção pública da ciência promovida em 2006 pelo MCT.

“Essa enquete mostrou que uma percentagem importante do público tem interesse declarado pela ciência e pouca informação sobre a área”, lembrou Moreira. “Além disso, tanto os cientistas quanto os jornalistas contam com grande credibilidade junto ao público, o que reforça a responsabilidade de ambas as categorias ao noticiar temas ligados à ciência.”


Bernardo Esteves (*)
Ciência Hoje On-line
13/10/2009

(*) O jornalista viajou a Belo Horizonte a convite da Fundep.

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NOTA IMPERTINENTE DESTE BLOGGER:

O jornalismo científico no Brasil somente será sério quando for um jornalismo objetivo, que ouve o outro lado, e que não se acovarde em abordar e apontar as insuficiências fundamentais das teorias científicas no contexto de justificação teória. Fora disso, o que temos é um jornalismo científico raquítico e acapachante, pois sofre da Síndrome ricuperiana: "O que Darwin tem de melhor, a gente mostra; o que Darwin tem de pior, a gente esconde".

Fui, com um ar de esperança de que essa realidade vergonhosa da Grande Mídia mude para melhor.