Na capa posterior da 4ª. edição do seu livro “Filosofia da Ciência”, São Paulo, Brasiliense, 1983, Rubem Alves “falou e disse”:
“O cientista virou um mito. E todo o mito é perigoso, porque ele induz o comportamento e inibe o pensamento. Existe uma classe especializada em pensar de maneira correta (os cientistas), os outros indivíduos são liberados da obrigação de pensar e podem simplesmente fazer o que os cientistas mandam. Antes de mais nada é necessário acabar com o mito de que o cientista é uma pessoa que pensa melhor do que as outras.”
Rubem Alves, um iconoclasta como este blogger? E contra uma posição arrogante da Nomenklatura científica já na década de 1980? Numa correspondência naquela época, perguntei sobre determinado assunto, e ele educada e polidamente, bem zen, me respondeu, se não me falha a memória: “Enézio, eu se fosse você não me importaria muito com o meu pensamento. Eu mesmo não dou tanta importância assim. O que pensei há cinco minutos atrás, eu não defendo mais.” Espero que hoje, 2007, ele não tenha renegado as idéias expostas neste livro importante sobre a filosofia da ciência.
Alves, mesmo assim, valeu a pena tê-lo conhecido pessoalmente numa conferência em Austin, Texas nos anos 1980s. Aprendi com você que o “discurso dos oprimidos”, dos “hereges” deve ser mais bem considerado. A heresia é uma escolha de um fragmento da verdade ainda não ecumenicamente acolhida.+++++
Nota deste blogger:
Nada pessoalmente contra os cientistas. Tenho vários amigos cientistas no Brasil e no exterior. Eu mesmo, se me permitirem, quero ser encontrado entre eles. O que vou transcrever aqui reflete tão-somente a minha inquietação com certa “ortodoxia corporativa”, corps d’esprit impedindo o avanço da ciência e até a promoção de brilhantes carreiras acadêmicas. Dogmatismo epistêmico. Inquisição sem fogueiras. Sei do que estou falando.
Feyerabend, porém, foi muito mais cruel do que eu ao criticar o critério de revolução científica de Kuhn. Ele afirmou que “... todas as asserções de Kuhn a propósito da ciência normal permanecem verdadeiras desde que se substitua a ciência normal por crime organizado.” [1]
[1] Giulio Giorello, “Revoluções Científicas”, in Dicionário de Filosofia. Trad. coordenada por Alfredo Bosi. Nicola Abbagnano, editor, 5ª. ed. rev. e ampliada, São Paulo, Martins Fontes, 2007, p. 1015.