“Como a fé desempatou o jogo”, de Okky de Souza: a ciência explica como o cérebro produz o pensamento mágico. (Veja 1994, de 7 de fevereiro de 2007, pp. 78-85). [Requer assinatura da VEJA ou do UOL]
Interessante a abertura deste parágrafo por Okky de Souza — ‘Muitos biólogos evolucionistas acreditam que as religiões – e tudo o que elas envolvem como instituições organizadas – surgiram como uma superadaptação do homem ao meio ambiente e prosperaram por conferir vantagens a seus praticantes’. Desde quando os cientistas ‘acreditam’? O que fazem é aceitar uma idéia, hipótese ou teoria, mas nunca ‘acreditar’ (argh, isso é como cometer um assassinato epistêmico).
O biólogo americano evolucionista David Sloan Wilson, da Universidade Binghamton, autor do livro A Catedral de Darwin: Evolução, Religião e a Natureza da Sociedade, afirmou que a crença no sobrenatural ajudou a convivência do grupo e seria a gênese da civilização. Eu não vou pegar no pé do biólogo americano, não vou pegar, não vou pegar. Vou pegar no pé do biólogo americano! Por que a crença num ser invisível, inexistente, ajudou nessa convivência entre os seres visíveis, e na origem da civilização? Como é que Wilson sabe disso?
Como que esse impulso religioso, presumivelmente altruísta, apesar de uma crença absurda num ser inexistente, foi ao mesmo tempo na história dos hominídeos uma que ajudou a criar e destruir grupos ao mesmo tempo? Eu chamo isso de ‘Theoria perennis’ — explica tudo, de Australopithecus a antropólogos.
Essa ‘projeção da mente hominídea’ tornou-os mais coesos, fraternos e solidários com os seus, mas essa mesma crença, segundo Wilson, ‘foi uma arma poderosa na luta contra adversários menos unidos e menos organizados’. Uma teoria que explica tudo, não explica nada.
Eu não sei se estou sendo injusto com o Okky de Souza ao atribuir-lhe esse besteirol do reducionismo biológico à la Dawkins, ou se ele desconhece essa questão controversa. Vamos acompanhar a Lógica Darwiniana 101: as leis naturais [quais são elas em biologia, alguém sabe me dizer? Eu sei em Física...] agora vão explicar fenômenos tidos como ‘sobrenaturais’: sub specie aeternitatis [sob a ótica da eternidade] é agora ‘naturalizada’ sub specie natura [sob a ótica da natureza]. Colocaram SUED num tubo de ensaio? Bem, não o Grande Extraterrestre Cósmico, mas os ‘crentes’ nesse ser invisível e inexistente.
Okky de Souza continua dizendo que a mais impressionante indicação da necessidade de se cultuar a divindade está estampada na evolução humana, conforme pesquisa realizada pelo biólogo molecular americano Dean Hamer, chefe do setor de estrutura genética do National Cancer Institute, e publicada em seu livro The God Gene: How Faith is Hardwired into Our Genes (O Gene de Deus: Como a Fé Está Embutida em Nossos Genes).
Aqui nós temos um caso onde um autor, cientista, escreve um livro, e não é recriminado por defender suas idéias assim. Nós do Design Inteligente quando lançamos livros somos repreendidos por isso, quando na verdade estamos seguindo o exemplo de Darwin, que não era biólogo de formação acadêmica, mas defendeu suas idéias assim como Hamer.
O reducionismo biológico de Hamer, à la Dawkins, é impressionante: ele afirma ter localizado no ser humano o gene responsável pela espiritualidade: gene SUED, oops, YHWH é mais primevo, mas chique. Esse gene produziria os neurotransmissores que regulam o temperamento e o ânimo das pessoas. Segundo Hamer, nossos sentimentos profundos de espiritualidade são nada mais nada menos do que química e eletricidade controlados pelo nosso DNA.
Uau, mas onde no genoma humano nós podemos identificar esse tal ‘gene SUED’ que garantiu a sobrevivência de Drawink e deu origem à civilização do Homo sapiens drawinksensis? Ironia do destino evolutiva contra a seleção natural, mecanismo cego, aleatório, e que não teve o ser humano em mente, precisou da crença no Grande Extraterrestre Cósmico, ser invisível e inexistente, projeção da mente do homem sobrevivente da Idade do Gelo há uns 30.000 anos atrás, para, durma-se com barulho desses, salvá-los desse cataclismo.
Por essa Dawkins, o apóstolo fundamentalista do neo-ateísmo chique e perfumado da pós-modernidade, não esperava: a sobrevivência de Drawink e do Homo sapiens drawinksensis, dependeu de uma ‘ajuda externa’ alheia ao processo natural de acaso, mutações filtradas pela seleção natural cega e inconseqüente: ser teísta na Idade do Gelo foi uma vantagem adaptiva de sobrevivência ao Grande Cataclismo Criogênico. Será que Hamer levou tudo isso em conta na sua pesquisa desse tal ‘gene YHWH’???
Não vou discutir aqui a subjetividade religiosa budista, e nem tampouco aos estudos anteriores ao de Hamer sobre a noção da espiritualidade estar entranhada nos genes. Será mesmo? Onde no genoma humano nós podemos identificar esse tal de ‘gene SUED’? Há como se traçar e pontuar a trajetória desse ‘gene miraculum’ no genoma humano da Idade do Gelo aos nossos dias? Ele é recessivo? Será que os ateus, agnósticos e céticos pós-modernos não teriam sido privilegiados pela onipotente e onisciente seleção natural com este maravilhoso gene de sobrevivência tendo em vista ao iminente apocalipse secularista do aquecimento global? Pobre Dawkins, ele não tem o ‘gene SUED’ correndo em suas veias...
Há uma outra explicação para o fato de a espiritualidade acompanhar o ser humano na sua evolução. O motivo de o conceito de Deus surgir nas sociedades humanas desde tempos imemoriais, mesmo entre as mais isoladas, não seria ‘uma projeção da mente humana’, mas segundo os descendentes de Drawink, é devido ao Deus revelatus...
Quanto ao divórcio entre a fé religiosa e a ciência, é realmente um fenômeno recente. Ele se encontra na ordem do dia devido à cruzada lançada por cientistas ateus [não possuem o ‘gene SUED’ no seu DNA] contra os ‘justos’ descendentes de Drawink pós-modernistas. Ironia do destino evolutivo: na Idade do Gelo, crer no ser invisível e inexistente foi uma forma que a onisciente e onipotente seleção natural ‘anteviu’ para a sobrevivência da espécie hominídea, agora, com a evolução podendo ser controlada, os anti-SUED, como Dawkins e Dennett querem se não destruir, mas enviar todos os Homo sapiens drawinksensis [que têm o ‘gene YHWH’] para um zoológico [in A Idéia Perigosa de Darwin].
Sem dúvida que até o fim do século XVIII foi lamentável a ação da Igreja Católica/Estado, mas que andava de braços dados com a ciência. Aqui eu destaco um fato pouco conhecido pelos meninos e meninas de Darwin: Galileu Galilei foi condenado pela Igreja Católica, mas com o aval e insistência da Nomenklatura científica da época. Essa é uma nódoa na Academia vestal que posa como virgem e imaculada eticamente. Nada mais falso. Alguém aí se habilite a escrever objetivamente a verdadeira história do affair Galileu (razão) e a Igreja (irracionalidade), pois o que temos é um folhetim ideológico dos que querem perpetuar o mito da guerra cultural ciência [racionalidade] versus fé [irracionalidade].
Infelizmente o cisma ideológico entre fé e ciência começou no Iluminismo, na França, pregando o uso da razão para explicar o mundo e o universo, desafiando o papel da religião na sociedade e propondo uma nova ordem social, na qual os interesses humanos estivessem no centro das decisões. Okky de Souza poderia avançar na História da Humanidade, e contar os horrores que foi a Revolução Francesa, e a fonte de inspiração que foi para idéias e governos genocidas que mataram mais de 100.000.000 [cem milhões] de pessoas até o século 20! [Vide O Livro Negro do Comunismo].
Somente no século XIX, Charles Darwin deixou o mundo perplexo com sua teoria da evolução das espécies, negando a criação bíblica, e as divergências entre o mundo da ciência e o da religião assumiram contornos de guerra cultural. Mas, as especulações transformistas do naturalista inglês não foram aceitas assim tão bem pela comunidade científica da época. Até Huxley, o fiel buldogue de Darwin, não acreditava na teoria da seleção natural, e recriminava Darwin por não aceitar o saltacionismo [tem gente que pensa que Niles Eldredge e Stephen Jay Gould foram os ‘pais’ desta teoria evolutiva alternativa].
Okky de Souza, como editor de uma grande revista como VEJA, não poderia escorregar na maionese ao descrever a vivência de um equilíbrio precário entre ciência e fé. Quem controla as universidades, os institutos de pesquisas, as revistas e publicações científicas, os guarda-cancelas, oops, peer-reviewers é mais chique? Teístas ou ateístas? SUED é ontologicamente objetivo e real? A natureza é tudo o que existe, existiu e existirá? O universo é fechado?
Ora, e daí se nos Estados Unidos, apenas 3% dos cientistas que pertencem aos quadros da National Academy of Sciences, acreditam em SUED? Que diferença faz a ciência normal que eles e os portadores do ‘genes SUED’ que são cientistas fazem? Nenhuma. Francis Collins é prova disso. Há vários cientistas laureados com o prêmio Nobel que foram ou são portadores do ‘gene YHWH’. Somente uma pequena correção, Richard Dawkins não é biólogo, é zoólogo. Qual foi mesmo o último trabalho com revisão por pares que ele fez nos últimos anos? Alguém pode me apontar?
Ele e outros filósofos, como Daniel Dennett, escrevem livros e artigos tentando desqualificar a religião como um mal que anestesia as sociedades e as priva das virtudes da razão. Ué, mas eles não tomaram conhecimento de pesquisas feitas por cientistas evolucionistas que a onipotente, onipresente, onisciente e previdente seleção natural não conferira ‘vantagem adaptiva’ ao Homo sapiens drawinksensis sobreviverem à Idade do Gelo? O que eles andam lendo? Tio Patinhas?
Aqui eu vou bater forte em Okky de Souza. É falso afirmar que os portadores do ‘genes SUED’ americanos contra-atacam insistindo que as escolas públicas americanas deixem de ensinar as teorias de Darwin e as substituam pelos ensinamentos da Bíblia. Eu vou cair de pau todas as vezes que os formadores de opinião da Grande Mídia Tupiniquim falarem uma estapafúrdia dessas em Pindorama — em 1987 a Suprema Corte dos Estados Unidos considerou inconstitucional o ensino do ‘criacionismo científico’ por entender que isso promoveria o ensino religioso de que um ser sobrenatural havia criado o ser humano [Aguillard v. Edwards 482 U.S. 578 (1987). QED, nenhum portador do ‘gene YHWH’ pode impedir que as teorias de Darwin sejam ensinadas e sejam substituídas pelos ensinamentos da Bíblia.
Aqui neste blog, a gente mata a cobra e mostra o pau. Minha jovem mãe dizia: ‘A mentira tem pernas curtas’!!!
O problema não está em personagens ilustres como o biólogo americano Francis Collins, um deísta que se declara cristão, tentarem ‘contemporizar’ que ciência e religião não se misturam e que se podem cultivar ambas. Tirem as crianças da sala. O buraco epistêmico é mais embaixo. Scientia qua scientia é EMPIRICA, EMPIRICE TRATANDA. O que temos hoje é o naturalismo metodológico no cativeiro do naturalismo/materialismo filosófico que posa como ciência.
Uma coisa que Okky de Souza precisa aprender urgentemente é que a ciência não prova nada. Quem prova são os cientistas. Todos nós temos pressuposições. Não existe cientista objetivo, despido de interesses pela verdade qua verdade científica. É preciso uma dose de ceticismo salutar em relação ao que dizem os cientistas quando dizem: “A ciência prova que...”.
É falso afirmar que o mote da ciência é a dúvida. Será? Então por que Okky de Souza não duvida um pouco sobre as especulações transformistas de Darwin — uma teoria nos seus estertores epistêmicos, quando escreve sobre ciência? Por que afirmar que o mote e a razão de ser da segunda é a fé? Qual é a diferença entre aceitar um axioma a priori [e.g: ancestralidade comum] e que SUED é um e três? Por que esta resistência no Homo sapiens drawinksensis em não aceitar o que a ciência prova que os ‘fenômenos sobrenaturais’ são apenas uma combinação entre reações químicas e elétricas no DNA? A Lógica Darwiniana 101 foi para o beleléu há muitas Idades do Gelo. Há 30.000 anos era um fator evolutivo adaptivo de sobrevivência — fato, Fato, FATO da evolução, agora é ‘irracionalidade’ que a ciência ‘prova’?
Não tenho procuração dos de concepções religiosas teístas, mas muitas das coisas afirmadas por Okky de Souza no seu especial procedem e depõem contra seus relatos sagrados. No meu pequeno entendimento nesta área, a ortopraxia e ortodoxia caminham juntas, assim também na ciência. Discordo dele quando afirma que a ciência já identificou o gene da espiritualidade, que evolução gravou em nosso genoma a necessidade da devoção e isso ajudou a espécie a sobreviver à Idade do Gelo.
Realmente as pesquisas arqueológicas e antropológicas mostram que diversos tipos de ancestrais humanos conviviam antes da Idade do Gelo, há cerca de 30.000 anos, e que os Cro-Magnon predominavam. Organizados em famílias, eles puniam o incesto, enterravam seus mortos, enfeitavam os túmulos, pintavam as paredes das cavernas. Mas será que era somente por deleite estético e espiritual...? Desconheço os de tradições religiosas que enxergam nesse salto evolutivo a interferência direta divina nos destinos da humanidade. Eles contam outra história sobre o Homo sapiens.
Os cientistas contam essa ‘just-so-story’, história da carochinha, que a brutal aceleração da competição por recursos escassos e a luta pela sobrevivência em condições climáticas adversas selecionaram os hominídeos de tal forma que restaram apenas aqueles que desenvolveram a capacidade de acreditar que aqueles tempos duros iriam passar, e que uma força superior iria trazer de volta as temperaturas amenas. Caracas, meu. Essa história de ninar dá para fazer qualquer adulto evolucionista ir dormir sem sentir medo de uma nova Idade do Gelo.
Não existe esse tal de ‘gene da espiritualidade’, e os exames de imagem mostram realmente os circuitos neurais envolvidos nas emoções suscitadas pelas orações, mas isso não é a ciência ‘provar’ o sobrenatural, mas simplesmente um fenômeno natural nos Homo sapiens drawinksensis. A busca pelas raízes da sua fé, não deveria mobilizar cientistas nem jornalistas científicos, pois a vida espiritual humana, assim como o Grande Extraterrestre Cósmico, não cabe num tubo de ensaio.
A VEJA continua VESGA nessas questões relativas a Darwin...