Explicações da diversidade dos vertebrados: por que Darwin estava e está errado na questão da especiação

terça-feira, setembro 07, 2010



Explicações da diversidade dos vertebrados 

06/09/10 

por David Tyler 01:01:54 pm 

Em 1996, o paleontólogo Mike Benton publicou uma análise fascinante dos dados evolucionários dos tetrápodes e concluiu: 

“A substituição competitiva provavelmente desempenhou um pequeno papel na história dos tetrápodes. Numa avaliação das origens de 840 famílias de anfíbios, répteis, aves, e mamíferos, menos do que 26%, e provavelmente menos do que 13%, foram identificadas como candidatas de substituições competitivas (CCR's em inglês).” 

“Competitive replacement has probably played a minor role in the history of tetrapods. In an assessment of the origins of 840 families of amphibians, reptiles, birds, and mammals, fewer than 26%, and probably fewer than 13%, were identified as candidate competitive replacements (CCR's).” 

O mecanismo alternativo proposto foi a adaptação aos novos habitats. Esta descoberta foi apresentada no artigo como trazendo uma ênfase diferente ao nosso entendimento de especiação do que foi formulado por Darwin: 

“Uma visão clássica em evolução tem sido a de que muitas radiações bem sucedidas de grupos de plantas e animais no Passado têm sido mediadas por interações competitivas. Novos grupos bem sucedidos são descritos como tendo suplantado e desalojado os organismos previamente estabelecidos, e assim tendo demonstrado alguma característica progressiva ou vantajosa. [...] O padrão de radiação dos tetrápodes, e na verdade, de muitos outros grupos, sugere que é improvável que a substituição competitiva foi preeminente.” 

“A classic view in evolution has been that many successful radiations of plant and animal groups in the Past have been mediated by competitive interactions. Newly successful groups are said to have outcompeted and displaced the previously established organisms, and hence to have demonstrated some progressive or advantageous feature. […] The pattern of radiation of tetrapods, and indeed of many other groups, suggests that it is unlikely that competitive replacement was paramount.” 



O padrão de evolução dos vertebrados, mostrando a importância relativa dos principais grupos através do tempo. 

(Fonte e mais detalhes aqui

Adiantando o relógio para o presente, com o benefício de um banco de dados muito mais amplo, Benton repetiu o estudo. Os autores disseram: 

“Este é o primeiro estudo investigando o elo entre a diversidade taxonômica e ecológica dos tetrápodes em uma escala global.” 

“This is the first numerical study investigating the link between tetrapod taxonomic and ecological diversity on a global scale.” 

As descobertas vindicam o estudo de 1996, e o direcionador [???] principal da diversificação é tido como sendo a expansão em novo ecoespaço. As pressões competitivas são consideradas como sendo de importância limitada porque a evidência para a competição direta não apareceu no estudo. A ênfase toda foi na expansão: 

“Os dados mostram múltiplas linhas de evidência para o papel da expansão como o direcionador principal da diversificação dos tetrápodes: (i) os tetrápodes exploraram somente um terço dos modos de vida habitacional; (ii) os tetrápodes ocuparam um número crescente exponencialmente de modos; (iii) a diversificação ecológica foi conduzida em uma taxa crescente por diferentes classes de tetrápodes; (iv) as classes de tetrápodes dominantes bem sucedidas aumentaram a taxa máxima do modo de utilização; e (v) os Tetrápodes exibem a incumbência ecológica, observada por um limite no qual o modo de utilização diminuiu, menos nas ocasiões de extinção em massa.” 

“The data show multiple lines of evidence for the role of expansion as the main driver of tetrapod diversification: (i) tetrapods have only explored a third of habitable modes of life; (ii) tetrapods have occupied an exponentially increasing number of modes; (iii) ecological diversification has been driven at an increasing rate by the different tetrapod classes; (iv) successively dominant tetrapod classes have increased the maximum rate of mode utilization; and (v) Tetrapoda exhibit ecological incumbency, observed by a limit at which mode utilization decreased, except at times of mass extinction.” 

Esta interpretação dos dados tem sido amplamente divulgada porque ela apresenta um quadro significativamente diferente do que é encontrado nos livros didáticos [de biologia do ensino médio]. A notícia da BBC News tinha o seguinte título: 

“Charles Darwin pode ter errado quando argumentou que a competição foi a principal força condutora da evolução.” 

“Charles Darwin may have been wrong when he argued that competition was the major driving force of evolution.” 

A notícia da BBC prosseguiu: 

“Ele imaginou um mundo no qual os organismos lutavam pela supremacia e somente o mais apto sobrevivia. Mas nova pesquisa identifica a disponibilidade de ‘espaço vital’, em vez de competição, como sendo de importância chave para a evolução. As descobertas questionam o antigo adagio de ‘a natureza, vermelha nos dentes e nas garras’. […] Este conceito desafia a ideia de que a competição intensa por recursos em habitats superlotados seja a principal força condutora da evolução. Professor Mike Benton, co-autor do estudo, explicou que a ‘competição não desempenhou um grande papel no padrão total da evolução’.” 

“He imagined a world in which organisms battled for supremacy and only the fittest survived. But new research identifies the availability of ‘living space’, rather than competition, as being of key importance for evolution. Findings question the old adage of ‘nature red in tooth and claw’. [. . .] This concept challenges the idea that intense competition for resources in overcrowded habitats is the major driving force of evolution. Professor Mike Benton, a co-author on the study, explained that ‘competition did not play a big role in the overall pattern of evolution’.” 

No seu blog, Sarda Sahney, a estudante candidata ao PhD que conduziu o estudo com colegas, identificou o autor do relato da BBC como sendo Howard Falcon-Lang (a significância disso é o assunto de comentário abaixo). Ela fornece um sumário da mensagem para se levar para casa desta pesquisa: 

"A rica biodiversidade que nós vemos hoje na Terra tem aumentado a partir da expansão, e não da competição. Darwin citou a competição entre os animais, cunhou a expressão 'sobrevivência do mais apto' [sic, a expressão é de Spencer], como um condutor da evolução no seu livro Origem das espécies; desde então a competição tem sido considerada chave no aumento da biodiversidade da Terra. Mas, embora a competição tenha sido observada em pequena escala, (eg. entre as espécies), há pouca evidência de competição dirigindo mudanças de grande escala na biodiversidade, tal como o domínio dos mamíferos e aves sobre os répteis e os anfíbios no mundo de hoje. A nossa nova pesquisa apoia a ideias de que os animais se diversificaram pela expansão em papeis ecológicos vazios em vez da competição direta uns com os outros.” 

“[T]he rich biodiversity we see on Earth today has grown out of expansion, not competition. Darwin cited competition among animals, coined 'survival of the fittest', as a driver of evolution in his book, On the Origin of Species; since then competition has been considered key to having grown Earth's biodiversity. But while competition has been observed on a small scale, (eg. between species), there is little evidence of competition guiding large-scale shifts in biodiversity, such as the dominance of mammals and birds over reptiles and amphibians in today's world. Our new research supports the idea that animals diversified by expanding into empty ecological roles rather than by direct competition with each other.” 

Consequentemente, a implicação de tudo isso é que nós precisamos pensar mais seriamente sobre o mecanismo principal de transformação evolucionária de Darwin: a seleção natural de variações hereditárias. A evidência do registro fossil não apoia este relato das origens. Em vez disso, as radiações dos vertebrados são radiações expansivas para dentro do ecoespaço. 

Neodarwinistas intransigentes deveriam prestar bastante atenção nisso! Contudo, as reações de alguns são para protestar a leitura errônea da significância que a pesquisa relatou. [Nota deste blogger: um exemplo brasuca] Um membro da equipe do NCSE, Steven Newton, escreveu um artigo com palavras duras com o título: Darwin was not Wrong – New Study Being Distorted [Darwin não estava errado – Novo estudo sendo distorcido]. O primeiro alvo dele é a notícia da BBC [Nota deste blogger: alguns brasucas também desceram o cacete na nota da BBC*]

“A ciência passa mal pedaços na mídia. […] Quando tópicos científicos são noticiados, consistentemente eles são mal entendidos e temperados com tal sensacionalismo que a significância original é distorcida de tal modo que é impossível reconhecer. Tal desvirtuamento noticioso aconteceu novamente –desta vez envolvendo Charles Darwin e a evolução. 

Um artigo recente publicado no journal Biology Letters, ‘Links between global taxonomic diversity, ecological diversity and the expansion of vertebrates on land,’ de Sarda Sahney, Michael Benton, e Paul Ferry, provocou um certo agitação. A normalmente séria BBC escreveu sobre este artigo, ‘Charles Darwin pode ter errado quando argumentou que a competição foi a principal força condutora da evolução.’” 

“Science fares poorly in the media. […] When scientific topics are reported, they are consistently misunderstood and spiced-up with such sensationalism that the original significance is contorted beyond all recognition. Such misreporting has happened again--this time involving Charles Darwin and evolution. 

A recent paper in the journal Biology Letters, ‘Links between global taxonomic diversity, ecological diversity and the expansion of vertebrates on land,’ by Sarda Sahney, Michael Benton, and Paul Ferry, has caused quite a stir. The normally-staid BBC wrote of this paper, ‘Charles Darwin may have been wrong when he argued that competition was the major driving force of evolution.’” 

A significância de Howard Falcon-Lang sendo o autor da notícia da BBC pode agora ser esclarecida. Falcon-Lang é um cientista profissional que tem publicado amplamente na literatura com revisão por pares. Ele escreve como cientista, e não como um jornalista procurando uma história de segunda mão. Ele sabe que o público precisa ler a ciência de modo acurado e interessante. Ele interpretou erroneamente o artigo? [Site brasuca neodarwinista intransigente acredita que sim]* 

Conforme Newton: “Um comunicado à imprensa sobre o artigo destacou que quando examinando mudanças de grande escala na biodiversidade, os dados sugerem: ‘Os animais se diversificaram pela expansão para dentro de papéis ecológicos vazios em vez de competição direta de uns com os outros’. Este artigo não argumenta que a concepção de Darwin de competição de pequena escala dentro das espécies esteja incorreta. Não argumenta que novas espécies surgindo de mudanças acumuladas seja um conceito falho. Não argumenta que Darwin estava errado.” 

Newton é quem está lendo erroneamente o artigo, que passou a identificar os fatores relevantes para a biodiversificação (a origem das espécies). O artigo afirma que a competição entre as espécies, se pequena ou grande escala, não é relevante para entender o fenômeno. Darwin não estava errado em afirmar que “competição de pequena escala dentro das espécies” ocorre realmente —mas ele estava errado em pensar que este fenômeno ajuda a explicar a origem das espécies! 

Em um blog anterior, foi destacado que algumas vezes é OK dizer que Darwin estava errado. Ninguém se importa quando isso é dito que Darwin estava errado sobre a origem da galinha doméstica. Mas há uma tremenda resistência para qualquer questionamento dos seus erros mais sérios. Esta nova pesquisa documenta um deles. 

Ninguém discute que Darwin documentou corretamente a competição entre as comunidades que se cruzam e entre as espécies diferentes. Todavia, qual é a evidência que isto é relevante para a origem das espécies? Esta nova pesquisa apresenta dados sólidos mostrando que outros fatores governam a radiação de vertebrados na Terra. As ideias já estavam por aí pelo menos desde 1996, e agora está mais do que na hora de os darwinistas esfriarem sua retórica e considerar seriamente estas descobertas científicas. 


Sarda Sahney, Michael J. Benton and Paul A. Ferry

Biology Letters, 2010, 23(4) 544-547 | doi: 10.1098/rsbl.2009.1024 

Abstract: Tetrapod biodiversity today is great; over the past 400 Myr since vertebrates moved onto land, global tetrapod diversity has risen exponentially, punctuated by losses during major extinctions. There are links between the total global diversity of tetrapods and the diversity of their ecological roles, yet no one fully understands the interplay of these two aspects of biodiversity and a numerical analysis of this relationship has not so far been undertaken. Here we show that the global taxonomic and ecological diversity of tetrapods are closely linked. Throughout geological time, patterns of global diversity of tetrapod families show 97 per cent correlation with ecological modes. Global taxonomic and ecological diversity of this group correlates closely with the dominant classes of tetrapods (amphibians in the Palaeozoic, reptiles in the Mesozoic, birds and mammals in the Cenozoic). These groups have driven ecological diversity by expansion and contraction of occupied ecospace, rather than by direct competition within existing ecospace and each group has used ecospace at a greater rate than their predecessors. 

See also: 


Proceedings of the Royal Society B, 1996, 263, 641-646 | doi:10.1098/rspb.1996.0096 

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NOTA DESTE BLOGGER:

* “Ou seja, deve-se tomar muito cuidado quando se lê artigos de divulgação científica. O mais lamentável é quando artigos deste tipo são mal elaborados em sites de divulgação científica como da inglesa BBC (veja aqui). Assim, não é de se espantar que cientistas não gostem de jornalistas. Fica parecendo que estes últimos são desprovidos de uma formação necessária e de um espírito critico que os tornem capazes de escrever artigos que traduzam o conteúdo de um artigo ou descoberta científica de maneira fidedigna. Herton Escobar, jornalista de divulgação científica do jornal O Estado de São Paulo, declarou recentemente, em evento realizado na UNICAMP, que é muito pequeno o número de jornalistas brasileiros com boa formação para fazer divulgação científica de qualidade.” Blog Quiprona

NOTA CAUSTICANTE DESTE BLOGGER:

Escobar, não é somente jornalistas científicos brasileiros que têm esta deficiência para fazer divulgação científica de qualidade. Alguns cientistas também...

Para pensar cum grano salis: 

Corruptio optimi pessima est [A corrupção dos melhores é a pior que existe].

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