Deus e Darwin nos trópicos: visões mais do que extremas da criação e evolução

sexta-feira, abril 02, 2010



Esta pesquisa Datafolha (publicada na Folha de São Paulo, 02/04/2010) sobre o criacionismo e as teorias sobre a origem e o desenvolvimento da espécie humana, revelou dados interessantes e esdrúxulos sobre criacionistas e evolucionistas. Um dado intrigante vai tirar o sono dos líderes religiosos e da Nomenklatura científica: a maioria dos brasileiros de 16 anos ou mais (59%) acredita na evolução humana ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas com Deus guiando o processo evolutivo. Darwin, quem diria, já não é mais um ‘estranho’ no ninho, oops, nos templos.

O contraste da ‘crença’ de criacionistas e evolucionistas também é interessante. Os criacionistas da Terra jovem ainda são maioria no Brasil: 25% acreditam que Deus criou os seres humanos do jeito que são hoje, há uns dez mil anos atrás. Os evolucionistas (8%) ‘acreditam’ [sic] que os seres humanos se desenvolveram ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, sem a participação de Deus. Acreditar é exercer fé. Para os criacionistas, acreditar não é novidade, mas evolucionistas ‘crentes’ é uma novidade sociológica que merece estudos: a religião é o ópio do povo.


Não foi novidade nenhuma o posicionamento dos espíritas ser majoritário quanto ao processo de evolução humana a partir de outras formas de vida sob o comando de Deus (74%), pois o transformismo faz parte do seu credo. A novidade é a parcela dos espíritas ser próxima (60%) entre católicos, evangélicos pentecostais e não-pentecostais. Uma possível indicação de sincretismo religioso. Abaixo da linha do Equador vale tudo. E no Brasil, até óleo se mistura com água. Lévi-Strauss que o diga.


Os criacionistas da Terra jovem (a maioria composta por adventistas de comportamento litúrgico sóbrio) vão ficar bastante incomodados em terem sido achados entre umbandistas (33%) e evangélicos pentecostais (30%): eles também acreditam que “Deus criou os seres humanos de uma só vez praticamente do jeito que são hoje, em algum momento nos últimos dez mil anos”. A maior surpresa é que, apesar de a visão evolucionista ser a única ensinada nas aulas de ciência, a pesquisa Datafolha mostrou que esses resultados estão acima da média da população. Huxley Dawkins e Dennett devem estar se perguntando: “Onde foi que nós erramos?”



Um dado extremamente inusitado é que até entre ateus há uma pequena parcela que ‘acredita’ ter Deus guiado o processo de evolução das espécies (23%). Nietzsche deve estar se revirando no túmulo. É, mas vai que Deus existe. Não custa nada se prevenir... A maioria dos ateus (56%), ‘crê’ [sic] que Deus não interferiu no desenvolvimento dos seres humanos. Uma possível indicação de que o darwinismo, qua ideologia, promove o ateísmo.

Diferentemente de pesquisas semelhantes realizadas nos Estados Unidos e União Europeia, nos diferentes segmentos brasileiros dá-se o contrário - quanto maior a renda e a escolaridade, mais pessoas acreditam na interferência divina no processo evolutivo dos seres humanos. Aqui ocorreu o inverso: o suspiro por Deus não é somente dos pobres e oprimidos. Nem Freud explica. Muito menos Marx.


Ah, não podia faltar o fosso entre as gerações. Nas diferentes faixas de idade, os jovens de 16-24 anos acreditam mais do que os mais velhos que Deus guiou o processo evolutivo das espécies. Estase epistêmica dos idosos ou os mais jovens ainda não ‘evoluíram’ o suficiente para distinguir a esquerda da direita?


Os índices também variaram nas diferentes regiões do Brasil. No Sul 51% dos entrevistados aceitam que a evolução humana se deu ao longo de milhões de anos a partir de formas menos evoluídas de vida, mas com Deus dirigindo o processo evolucionário. No Nordeste sobe para 63% e Norte/Centro Oeste para 66%. Ó xente, bixim, tá cum a muléstia darwiniana!

+++++

NOTA DESTE BLOGGER:

Eu fui convidado por Hélio Schwartsman, da FSP, mas declinei e indiquei nome de outras pessoas que talvez topariam o convite. Depois me arrependi, mas já era tarde, pois o convidado já tinha aceito o convite. Duas coisas ficam patentes nesta situação: eu não posso mais dizer que a Folha de São Paulo 'não dá espaço' para visões diferentes de Darwin, mas a FSP ainda continua fazendo a leitura errada do Design Inteligente -- sistemas biológicos de complexidade irredutível e informação complexa especificada não são encontrados na Torá, nem na Bíblia dos cristãos, tampouco no Alcorão, mas nas coisas bióticas e outras coisas no universo, mas Hélio Schwartsman insistiu em rotular o DI como "nada mais é do que criacionismo com pretensões científicas." Eu não sabia que complexidade irredutível de sistemas bióticos e informação complexa especificada -- temas recorrentes em pesquisas científicas e artigos científicos, a favor e contra, sejam "Artigos de Fé".

Falta agora a Folha de São Paulo, após ter sido alertada por este blogger há mais de uma década, cobrir as insuficiências epistêmicas da atual teoria da evolução no contexto de justificação teórica, e por que uma nova teoria da evolução está sendo elaborada -- a SÍNTESE EVOLUTIVA AMPLIADA que, pelo avanço da ciência em várias áreas, não pode e nem deve ser selecionista. Mas isso a FSP não tem coragem de cobrir, pois vive uma relação incestuosa com a Nomenklatura científica, e pela Weltanschauung da maioria dos que compõem seu corpo editorial (ateus, agnósticos y otras cositas mais), está atrelada ao naturalismo filosófico que posa como se fosse a própria ciência, hoje não tem coragem de fazer isso, mas talvez um dia, quem sabe amanhã mesmo, ouse ser corajosa e aborde a nudez epistêmica de Darwin.

Mesmo assim, já foi um avanço. Valeu Hélio!