28/1/2010
Por Thiago Romero
Agência FAPESP – Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) têm obtido resultados importantes em um estudo com foco na quantificação de fluxos de cálcio e na participação de transportadores de cálcio na contração e relaxamento de ventrículos de corações de ratos em desenvolvimento.
Pesquisas propõem abordagens para o tratamento e prevenção de doenças cardiovasculares por meio do estudo do transporte e da regulação de cálcio no coração (BGSU)
No miocárdio desses mamíferos, a maior parte do cálcio que produz contração tem origem em um local de estoque intracelular, o retículo sarcoplasmático. O estudo verificou que o transporte do mineral entre o retículo sarcoplasmático e o citoplasma da célula cardíaca é o principal sistema responsável pelo desenvolvimento de contração e relaxamento no coração dos animais, desde o dia do nascimento.
A pesquisa foi conduzida por José Wilson Magalhães Bassani, professor titular da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação, e por Rosana Almada Bassani, do Centro de Engenharia Biomédica.
“Até então, acreditava-se, principalmente com base em dados de biologia molecular e de inibição da função reticular, que o retículo sarcoplasmático tinha um papel secundário no acoplamento excitação-contração no coração do recém-nascido”, disse Rosana à Agência FAPESP.
“Nosso estudo, com foco quantitativo na interação dos diferentes transportadores, realizado em células vivas intactas, contribuiu para a reversão desse conceito equivocado. Além disso, com relação à importância do retículo sarcoplasmático no transporte de cálcio, há mais semelhança entre corações imaturos e maduros do que se acreditava anteriormente”, apontou.
Os estudos feitos na Unicamp demonstram que o vazamento de cálcio do retículo sarcoplasmático tem um importante papel na geração da atividade espontânea de células marca-passo cardíacas, e também em células miocárdicas com sobrecarga de cálcio, podendo levar, nesse último caso, ao aparecimento de arritmias.
“Esse fenômeno tem recebido grande atenção de pesquisadores em todo mundo, mostrando-se um possível alvo de intervenções terapêuticas em certos casos de arritmia cardíaca”, disse Rosana.
O projeto de pesquisa, que teve início com o Projeto Temático “Transporte de cálcio em miócitos ventriculares de ratos durante o desenvolvimento pós-natal”, apoiado pela FAPESP, aponta ainda que o padrão de interação entre os diversos transportadores de cálcio em células miocárdicas em corações de recém-nascidos apresenta diferenças com relação ao padrão adulto, o que pode nortear o desenvolvimento e a administração de medicamentos para uso pediátrico.
“Ainda não está bem claro qual é o impacto da regulação neural sobre os transportadores de cálcio miocárdico durante o desenvolvimento dos indivíduos”, disse Rosana. Para investigar melhor a questão, o grupo conta atualmente com um Auxílio à Pesquisa – Regular da FAPESP, coordenado pela pesquisadora e que dá continuidade aos trabalhos desenvolvidos anteriormente.
Segundo ela o interesse da pesquisa nesse caso abrange questões relacionadas ao transporte de cálcio no miocárdio, buscando esclarecer desde aspectos fundamentais, como o processo de acoplamento excitação-contração (liberação fracional de cálcio do retículo sarcoplasmático e sua regulação), até o envolvimento desse íon na geração de arritmias cardíacas.
“Resultados preliminares mostraram que os miócitos cardíacos de ratos neonatos respondem com considerável mobilização de cálcio ao neurotransmissor simpático noradrenalina, mesmo que a inervação simpática do coração ainda não esteja desenvolvida nesses animais”, disse Rosana.
Isso indica que, desde o nascimento, as células cardíacas já estão aparelhadas para produzir contrações mais intensas em resposta à sinalização neuro-hormonal simpática.
“Espera-se que o conhecimento adquirido no conjunto dos estudos possa contribuir para entendimento das modificações fisiológicas da função cardíaca e sua regulação durante o desenvolvimento pós-natal e em condições fisiopatológicas”, ressaltou.
Estimativa dos fluxos de cálcio
As equipes dos pesquisadores, no Laboratório de Pesquisa Cardiovascular do Centro de Engenharia Biomédica, também estudam quantitativamente o transporte e a regulação de cálcio no coração, com o objetivo de estabelecer a importância de cada transportador e melhorar o entendimento sobre as relações entre eles.
Entre as abordagens em andamento, José Wilson Bassani destaca o esforço pelo desenvolvimento de novos métodos para a estimativa dos fluxos de cálcio e a quantificação da contribuição de diferentes transportadores do íon para processos como desenvolvimento de contração e relaxamento do coração.
“Essa abordagem tem permitido identificar variações na interação de transportadores com espécies animais, inclusive em humanos, além de condições patológicas, como hipertensão arterial e insuficiência cardíaca”, disse.
O professor explica que o íon cálcio desempenha múltiplas funções nas células do organismo humano, afetando a função celular desde o nível genético e regulatório até as atividades elétricas e mecânicas. “Em músculos, o cálcio é o principal sinalizador para a contração e, particularmente no coração, sua concentração citoplasmática oscila precedendo cada contração”, explicou.
No coração, o íon é necessário para a geração da atividade elétrica e do disparo e manutenção da atividade contrátil. Além disso, diversos transportadores de cálcio existentes na célula cardíaca regulam as variações intracelulares do íon para a execução das diversas funções do coração.
“Em muitas doenças cardiovasculares, as alterações do transporte celular de cálcio podem ser uma das causas primárias do mau funcionamento da bomba cardíaca, gerando insuficiência contrátil e alguns tipos de arritmias”, conta.
Resultados obtidos pela equipe têm sido publicados em importantes revistas científicas internacionais, como oAmerican Journal of Physiology, Biophysical Journal, Journal of Physiology, Journal of Molecular and Cellular Cardiology, Cell Calcium, European Journal of Physiology e IEEE Transactions on Biomedical Engineering.