Leonard Mlodinow, PhD em física e matemática, é um cientista fora do convencional. Como imaginar que um físico especializado em educação para crianças e adolescentes e fascinado com números pudesse ser também um roteirista para filmes de entretenimento, como a série “Jornada nas Estrelas”?
Pois foi exatamente por causa disso, e da extrema clareza com que escreveu seu primeiro livro, A Janela de Euclides, que Mlodinow foi escolhido para ajudar a ninguém menos que Stephen Hawking a escrever a seqüência do mega-sucesso Uma Breve História do Tempo – o que ele está fazendo agora, para publicação em 2005.
A curiosidade é uma das principais características dos cientistas – e curioso Mlodinow foi sempre, desde criança. Cursava ainda a 5ª série do ensino fundamental quando, ao fazer experiências com foguetes, explodiu a garagem de sua casa e só não perdeu a visão porque, prudente, usava óculos de segurança. Mas passou um bom tempo com os dois braços enfaixados.
A experiência foi dolorida, mas não o suficiente para limitar seu interesse pela ciência. Foi também na 5ª série que Mlodinow descobriu o universo fascinante da geometria e sua beleza. Desde então, debruçou-se com entusiasmo sobre este tema. Seu primeiro livro, lançado agora pela Geração Editorial (A |Janela de Euclides, 296 páginas, R$ 39,50), narra a história da geometria de forma clara e elucidativa, contrariando a idéia de que a matemática é um assunto pesado e para especialistas.
Como todas as pessoas curiosas, Mlodinow não se limitou a uma única área de interesse. Na Universidade da Califórnia, em Berkeley, quando ainda era aluno na pós-graduação, fez um roteiro que abriu para seu talento as portas de Hollywood. Até hoje ele é chamado com freqüência para escrever roteiros científicos ou trabalhar como consultor em filmes de ciência ou ficção científica. Costuma fazer palestras e já desenvolveu CD-ROMs educativos que foram campeões de venda e receberam inúmeros prêmios.
A geometria, pelas suas mãos, perde todo o ranço das matérias insondáveis. Esta ciência, afinal, permeia todo o mundo em que vivemos. Ela afeta as nossas percepções de arte e música. A pintura e a escultura seguem princípios geométricos básicos de proporção e simetria; as relações definem as escalas musicais e as composições clássicas são altamente matemáticas em sua natureza. A arquitetura busca na geometria as bases do que é possível construir. Até o corpo humano tem uma elegância geométrica em si: o famoso desenho de Leonardo da Vinci de um homem em pé dentro de um círculo é uma demonstração de com nossa fisiologia se harmoniza com a natureza e suas leis.
Beleza pura
Essa beleza, e a emoção de percebê-la em tudo o que há no universo, perpassa todo o livro de Mlodinow, que pode ser compreendido por crianças – ser entendido pelas crianças sempre foi o objetivo do escritor –, adolescentes e adultos. A Janela de Euclides elimina a idéia de que cientistas são seres frios e sem emoções. Percebemos com este livro o quanto as histórias do desenvolvimento das idéias e da civilização podem encantar, dependendo de como são contadas.
– Acredito que a história de quase tudo desenvolvido pela matemática e pela ciência pode ser escrito de maneira interessante porque, tendo-a vivido, eu sei que a criação do progresso científico é um processo muito emocionante com personagens interessantes, bastante altos e baixos, e de situações dramáticas – afirma o autor.
O manifesto da revolução original da geometria foi escrito por um homem misterioso chamado Euclides. Com seu livro, Os Elementos, Euclides abriu uma janela através da qual a natureza de nosso universo tem sido revelada. Depois dele, outras quatro revoluções transformaram a geometria. Mlodinow descreve quais foram estas revoluções, os profetas e as histórias atrás de cada uma delas: desde Euclides, na Antiguidade, até à teoria das cordas e do hiper-espaço.
Mlodinow vai descortinando as sucessivas descobertas da humanidade, desde o momento em que alguém começou a medir um terreno para cobrar impostos, ou o próprio país, para definir suas fronteiras, até que a humanidade se descobriu medindo a terra e o universo.
Primeiro, um grego, Pitágoras, descobriu as linhas paralelas e montou seu modesto sistema de regras abstratas que podiam modelar o mundo. A humanidade haveria de perder algum tempo na Idade Média, até que, na França do século XIV, um obscuro bispo católico inventou o gráfico e juntou linhas e números. Enquanto marinheiros intrépidos viajavam de um lado para o outro no oceano Atlântico indo ao Novo Mundo, um gênio de 15 anos de idade chegou à conclusão de que, assim como a superfície da Terra, o espaço também poderia ser curvo. As linhas paralelas poderiam realmente se encontrar? Os ângulos de um triângulo poderiam totalizar – mais ou menos - 180 graus? A revolução do espaço curvo reinventou tanto a Matemática quanto a Física; isto também preparou o cenário para um funcionário de um escritório de patentes chamado Einstein adicionar o tempo às dimensões do espaço. Sua grande revolução geométrica anunciou a era moderna da Física.
Vivemos em meio a uma revolução científica. Por todo o mundo, cientistas estão reconhecendo que todas as forças maravilhosas e variadas da Natureza podem ser entendidas através da geometria – uma nova geometria bem estranha. É uma matemática excitante de dimensões extras e retorcidas, nas quais o espaço e o tempo, a matéria e a energia se entrelaçam e se revelam como conseqüências de uma estrutura profunda subjacente do universo.
O livro de Mlodinow está recheado de uma grande pesquisa histórica. Mas Mlodinow também trouxe sua experiência e estudo com amigos cientistas de extrema importância para a ciência atualmente: Richard Feynmann, Stephen Hawking e Kip Thorne. Além deles, Leonard Mlodinow também se valeu de entrevistas com físicos e matemáticos aclamados em nossa época: Murray Gell-Mann, Edward Witten e Brian Greene.
O que mais fascina no livro, além dessa enorme quantidade de conhecimento em poucas páginas, é a facilidade com que se lê e se compreende tudo. Leonard Mlodinow consegue como poucos o milagre de contar uma história complexa de forma tão agradável, engraçada e fascinante que, depois de ler seu livro, nenhum espaço, nenhuma coisa e nenhum tempo será novamente igual como era antes.
Fonte.
Leia entrevista com Leonard Mlodinow aqui.
Tradução: Enézio Eugênio de Almeida Filho