Fósseis apontam ligação entre aumento da temperatura e extinção em massa há 200 milhões de anos
Representação artística de uma paisagem do leste da Groenlândia no final do período Triássico, quando a região abrigava uma floresta subtropical. Nessa época, a diversidade de plantas caiu abruptamente, ao mesmo tempo em que a concentração de gás carbônico aumentava na atmosfera (arte: Marlene Hill-Donnelly / The Field Museum).
Fósseis de plantas podem ajudar a compreender as possíveis causas para a extinção em massa que ocorreu na transição do período Triássico para o Jurássico, 200 milhões de anos atrás. Um estudo aponta que a diversidade da flora do leste da Groenlândia caiu abruptamente logo antes desse evento de extinção, em um período em que houve um leve aumento do gás carbônico na atmosfera.
Liderado pela bióloga Jennifer McElwain, da University College Dublin (Irlanda), e publicado na Science desta semana, o estudo contraria uma hipótese anterior de que a queda da biodiversidade e a extinção do Triássico-Jurássico teriam acontecido de forma gradual. Segundo McElwain, o estudo também serve de alerta para os possíveis impactos do aquecimento global e da degradação ecológica atuais.
A bióloga e seus colegas analisaram fósseis de seis grupos de plantas do leste da Groenlândia encontrados no sítio paleontológico conhecido como Kap Stewart Group. Eles perceberam um declínio repentino na quantidade e na diversidade de três grupos encontrados (em profundidades inferiores a 35 metros). De acordo com o artigo, essa queda abrupta pode ser situada no período entre 300 mil e 500 mil anos antes da transição para o Jurássico.
Fóssil de planta do gênero Lepidopteris, comum no leste da Groenlândia há cerca de 200 milhões de anos. Essa foi uma das muitas espécies extintas na transição do período Triássico para o Jurássico, quando os dinossauros emergiram (foto: Jennifer McElwain).
CO 2 e aquecimento global
A partir do estudo dos fósseis, os pesquisadores também perceberam que, simultaneamente à queda súbita na diversidade das plantas, a concentração de gás carbônico na atmosfera sofria um leve aumento. “Esse fenômeno foi provavelmente causado por uma atividade vulcânica intensa no oceano Atlântico”, especula McElwain em entrevista à CH On-line.
Como o gás carbônico na atmosfera contribui para o efeito estufa, sua maior concentração levou também a um aumento na temperatura média do planeta. Segundo os cientistas, esse teria sido um dos fatores responsáveis pela queda da diversidade de plantas no final do período Triássico.
No entanto, como o aumento do gás foi suave, eles consideram também outras possibilidades. “Acreditamos que um aumento na concentração do dióxido de enxofre também pode ter contribuído para a morte de plantas”, avalia McElwain. “Embora ainda não tenhamos conseguido detectar esse aumento no passado, estamos cultivando plantas em estufas com alta concentração de dióxido sulfúrico para testar essa hipótese.”
Segundo o artigo, a queda na biodiversidade observada a partir dos fósseis é compatível com a forma como as plantas responderiam a transformações ambientais catastróficas, e não a mudanças lentas e graduais, como se acreditava.
Mera coincidência?
Há 200 milhões de anos, um aumento na concentração de gás carbônico aumentou em alguns graus a temperatura média global. O cenário lhe soa familiar? McElwain confirma: sim, é possível fazer um paralelo da situação climática e ecológica do fim do Triássico com o aquecimento global que vivemos hoje. Mas será que estamos próximos de uma extinção em massa ou de um declínio brusco na biodiversidade do planeta?
Fósseis com 200 milhões de anos de parte de uma cicadácea e uma conífera, encontradas no leste da Groenlândia (foto: Jennifer McElwain).
“Ficamos surpresos ao descobrir que uma queda tão grande na biodiversidade coincidiu com um aumento de gás carbônico relativamente pequeno”, comenta a bióloga. Segundo ela, o estudo mostra que a perda de biodiversidade do fim do Triássico coincidiu com uma concentração de gás carbônico de 900 partes por milhão. “De acordo com algumas previsões, em 2100, o nível do gás será aproximadamente esse”, completa.
No entanto, esse é um cenário pessimista, no qual a população mundial continuaria a depender de combustíveis fósseis. “Não podemos fazer uma analogia completa, porque a perda de diversidade que observamos no passado também pode ser atribuída ao aumento de dióxido sulfúrico”, pondera McElwain.
Seja como for, o estudo mostra que transformações ambientais globais podem levar a extinções em massa repentinas. “Embora a maioria dos ecossistemas modernos ainda não tenham chegado ao seu clímax na resposta a mudanças climáticas, muitos deles já entraram em um período de mudanças ecológicas, e os sinais iniciais de deterioração já são óbvios”, explica a bióloga.
Isabela Fraga
Ciência Hoje On-line
18/06/2009