Em 1998 eu abordei no Observatório da Imprensa a relação incestuosa da Grande Mídia Tupiniquim e a Nomenklatura científica na cobertura das atuais teorias da origem e evolução do universo e da vida. Contatei diversos editores de ciência, jornalistas científicos e, pasmem, até ombudsman, mencionando as insuficiências epistêmicas fundamentais dessas teorias, e o debate interno entre os especialistas sobre essas questões de contexto de justificação teórica.
Reação da Grande Mídia e da Nomenklatura científica tupiniquins? Silêncio pétreo e o ignorar por ignorar das questões levantadas por este “simples professorzinho do ensino médio” [será???]. Como se essas questões não interessassem ao grande público leitor não-especializado, e à própria ciência.
Popper, Kuhn, Lakatos e Feyerabend, nós precisamos urgentemente de vocês.
É, mas nem tudo está perdido. Entre 2006 e 2007 foram publicados no Observatório da Imprensa três artigos importantes sobre a questão do jornalismo científico tupiniquim:
1. Da analogia imperfeita às distorções
Por Rubens Pazza em 19/9/2006
“A mim ensinou-me tudo” (Fernando Pessoa); “Papai vai lhe ninar” (Dorival Caymmi); “Você foste ou não foste?”(Chico Buarque). Os trechos citados contêm erros de português propositais, melhorando a sonoridade dos textos e a clareza das idéias dos autores. No entanto, tais erros propositais são considerados “licenças poéticas”, não erros, e são bastante utilizados em poesias e músicas. Tais erros, embora firam a norma culta, não dificultam a compreensão do texto, pelo contrário: em muitos casos facilitam sua compreensão. É fato que atualmente é complicado identificar o que é licença poética e o que é falta de cultura e desconhecimento da língua portuguesa, como observado em letras de várias músicas da moda.
Utilizando este artifício, podemos identificar na literatura de divulgação científica muitas “licenças científicas”. Explicar como a ciência funciona a leigos realmente não é tarefa fácil. É comum que cientistas divulgadores se utilizem de analogias imperfeitas para demonstrar o que querem explicar, como Richard Dawkins costuma fazer muito bem, especialmente em sua analogia dos genes com uma biblioteca vasta em volumes (em O gene egoísta). Na maioria destes casos, as analogias e outras licenças científicas são muito produtivas em sua finalidade. No entanto, seria interessante uma discussão sobre outros tipos de licenças científicas. Há um constante uso de termos que, embora pareçam facilitar o entendimento da população em geral, podem confundir ainda mais, especialmente quando tais pessoas buscam mais esclarecimentos sobre o assunto. Em outros casos, os termos utilizados nos textos fazem alusão a situações que distorcem completamente o sentido da notícia científica.
Podemos analisar alguns exemplos. O estudo do genoma mitocondrial de populações humanas ao redor do mundo permitiu estimar o ancestral comum mais recente entre a maioria dos humanos viventes. Os cientistas, por algum motivo, a chamaram de “Eva mitocondrial”. Não demorou muito para que religiosos usassem a notícia como prova científica da existência da Eva bíblica. Ou seja, a tentativa de popularizar uma notícia científica com uma licença científica, uma vez que não há nenhuma evidência de que tal ancestral comum realmente seja a Eva bíblica, serviu como arma contra a própria ciência.
Erro de código
Certamente discussões de bastidores subseqüentes podem ter esclarecido a questão; no entanto, para uma pessoa que está alheia aos bastidores da discussão científica, a Eva mitocondrial pode muito bem ser a Eva bíblica. Uma analogia bíblica também foi feita em relação ao fato de uma determinada espécie que antes era considerada extinta ser encontrada com vida na natureza – efeito Lázaro. Embora menos polêmica em relação à questão religião/ciência, este termo amplamente empregado inclusive em meios acadêmicos é equivocado, pois não encontrar uma determinada espécie na natureza não significa que ela não exista. O efeito realmente foi o de uma melhoria nas verbas que permitiram ampliar os estudos.
Para o público em geral, tal termo pode induzir à idéia de que a espécie estava extinta e, de repente, voltou a aparecer ou tenha sido recriada. É claro que se pode dizer que o Lázaro citado na Bíblia poderia não estar morto, mas aparentemente morto, como as espécies que poderiam estar aparentemente extintas. Infelizmente, este não é o pensamento da grande maioria da população ocidental, o que certamente gera confusão. A “licença científica” normalmente não explica, apenas confunde. Ainda, na paleontologia, temos a freqüente expressão “fóssil vivo”. Como pode existir um fóssil vivo?
Outra expressão que freqüentemente aparece no noticiário é que os “cientistas descobriram o código genético” de determinada espécie. Na realidade, o que eles queriam dizer é que os cientistas descobriram a seqüência de nucleotídeos do DNA de uma espécie. Por mais difícil que possa ser dar uma notícia como esta, a expressão “código genético” jamais deveria ser empregada. O código genético é um mecanismo, um tipo de dicionário (usando licença científica), que informa de que maneira uma seqüência de nucleotídeos de uma molécula de RNA determina a seqüência de aminoácidos da proteína que ele produz. Por acaso alguém diz que, na interceptação de uma mensagem de Cuba pelo governo norte-americano, por exemplo, “os norte-americanos identificaram o código Morse que vinha de Cuba”?
Engajamento e preparo
A genética é uma área cheia de licenças científicas como esta, talvez por ser uma área de difícil compreensão por sua complexidade. Um outro exemplo comum é encontrar o termo “carga genética” aplicado como sinônimo de genoma. Carga genética é uma medida dos alelos deletérios para o organismo, que significa literalmente uma carga, um peso, algo que um organismo pode suportar até certo ponto. Genoma é um termo mais adequado para se referir ao conteúdo genético de um organismo. É um termo bastante conhecido, não há motivos para não utilizá-lo.
Enquanto estas licenças científicas vão aumentando em variação e quantidade na mídia em geral, a população em geral pode ser prejudicada. Certamente, em muitos casos a pessoa não está interessada em se o termo é certo ou nem quer ter mais informações sobre um assunto. Basta este mínimo de informação. Entretanto, um número menor de pessoas pode estar interessado. Como o objetivo do jornalismo é o de levar a informação, é esperado que este papel seja desempenhado com o máximo de acuidade. As pessoas respeitam o que lêem ou ouvem no noticiário. A mídia é formadora de opinião. Como podemos pensar em um debate sério na sociedade sobre assuntos polêmicos, como o uso terapêutico de células-tronco, por exemplo, se as pessoas em geral desconhecem ou confundem o assunto?
O que precisamos é de cientistas mais engajados na divulgação científica e jornalistas mais bem preparados. Certamente a linguagem dos textos de divulgação científica deve atingir todas as camadas populacionais, mas é preciso ter muito cuidado em não vulgarizar, não deturpar o fato científico. Mais do que isso, a divulgação científica deve instigar a pessoa a buscar mais, aprender mais, conhecer mais. Um excesso de vulgarização leva à conformação com o material pronto, útil muitas vezes, mas que, definitivamente, não instiga o leitor.
2. Imprecisão e licença científica, o retorno
Por Rubens Pazza e Karine Frehner Kavalco em 27/11/2007
"Quando eu uso uma palavra, ela significa exatamente o que eu quis que ela significasse, nada mais, nada menos." (Lewis Carroll, em Alice no país das maravilhas).
Imagine se cada um utilizasse, no cotidiano, palavras conhecidas, mas com significados próprios. Como seria possível manter um diálogo, discutir as ações dos políticos, os acontecimentos diários, as próprias relações humanas, ou simplesmente comprar um pãozinho na padaria da esquina? Há uma vertente da lingüística que afirma que o importante na comunicação não é a exatidão, mas a capacidade de compreensão do ouvinte. Se o ouvinte entendeu a mensagem, não importa que palavras o interlocutor utilizou. A intenção, aqui, não é discutir se esta ou aquela vertente da lingüística é mais adequada ou correta, mas insistir na questão de que a divulgação científica requer responsabilidade e informação correta.
As notícias científicas veiculadas pela mídia, tanto impressa quanto em hipertexto, freqüentemente apresentam problemas de imprecisão, em especial nos termos utilizados, o que já foi abordado como uma "licença científica" (ver, neste Observatório, “Da analogia imperfeita às distorções”). Um caso extremamente recorrente e que desejamos discutir no presente texto é o da utilização do termo "código genético". Um rápido levantamento das notícias veiculadas em websites de grandes jornais do país, como a Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, entre outros, demonstrou que, em absolutamente todos os casos em que o termo "código genético" foi utilizado, seu emprego foi incorreto. Embora em menor grau, até revistas especializadas como a Scientific American Brasil já tiveram seu momento de licença científica em relação ao código genético.
A língua da hereditariedade
Antes de discutir os empregos adotados pelos jornalistas para o termo "código genético", vamos relembrar de onde ele surgiu e seu verdadeiro significado. O início do século 20 foi marcado, dentro da área da biologia, pela elucidação dos mecanismos de herança das características e pelo papel do DNA (ácido desoxirribonucléico) no processo. Em meados da década de 1950, mais precisamente em 1953, Watson e Crick desvendaram a estrutura do DNA (sobre os ombros de gigantes, que descobriram outras informações pertinentes) e seu mecanismo de replicação, ou seja, como uma molécula de DNA serve de molde para a construção de outra molécula de DNA. A partir daí, soubemos que o DNA é composto por unidades repetidas de moléculas menores, os nucleotídeos, e que estes podem ser de quatro tipos – adenina, timina, citosina e guanina, representados pelas letras A, T, C e G, respectivamente.
Detalhes maiores sobre a estrutura do DNA são irrelevantes, no momento. Uma analogia freqüentemente utilizada por autores de divulgação científica, como Richard Dawkins, é a de que o genoma humano, por exemplo, seria formado por uma biblioteca composta por 23 volumes (cromossomos). Cada volume tem diversas páginas com palavras escritas pela disposição seqüencial de letras (nucleotídeos).
Semelhantemente ao DNA, as proteínas são formadas por unidades menores, os aminoácidos, que são unidos uns aos outros de forma linear (mais uma vez, detalhes são irrelevantes). Isso significa que a informação hereditária (DNA) contida em cada volume está escrita em uma língua, enquanto as características (proteínas) estão escritas em outra língua, ou seja, a informação está codificada. A dificuldade da empreitada de se decifrar a codificação utilizada pelos organismos vivos era a de que a língua da hereditariedade era composta por seqüências de quatro letras (nucleotídeos), enquanto a língua das características era formada por 20 letras (aminoácidos). Tornou-se necessário, então, desvendar qual seria o dicionário que traduz a informação de uma língua para outra, ou seja, qual seria o código da hereditariedade, ou código genético.
Uma nova seqüência
O astrônomo Gamow, com importante contribuição na teoria do Big Bang, foi um dos primeiros a dedicar-se à empreitada de desvendar o código genético. A conclusão relatada posteriormente é a de que cada grupo de três nucleotídeos (denominado um códon) no DNA significa um aminoácido na proteína. Por exemplo, o códon ATG significa o aminoácido metionina. O que é mais importante nesta descoberta (sem entrar em detalhes) é que este código é o mesmo para a imensa maioria dos organismos vivos, de modo que o código genético é considerado universal. Ou seja, o mesmo dicionário traduz a informação que está nas plantas, nos animais, nas bactérias. O código genético é uma das mais fortes evidências de ancestralidade comum entre todos os organismos vivos.
Assim, quando lemos nos jornais, revistas e websites que um grupo de pesquisadores desvendou o código genético de determinado organismo vivo, o que se espera é que eles tenham descoberto um novo dicionário, não um novo livro. No entanto, o que vemos na leitura da íntegra da notícia ou do artigo originário publicado pelos pesquisadores, na imensa maioria destas notícias, é que a pesquisa, na verdade, trata do seqüenciamento do genoma, o que nada mais é que a descoberta da seqüência dos nucleotídeos do DNA do organismo, ou seja, a leitura de outro livro. Os cientistas decifraram as palavras do livro, e não um novo dicionário. O caso mais recente foi o do fungo da caspa. O que foi descoberto é qual a seqüência de nucleotídeos do DNA do fungo, e não de que forma o fungo traduz a informação de seu DNA em proteína; afinal, isso já está devidamente conhecido.
Para ilustrar este erro comum, voltemos ao códon exemplificado anteriormente. ATG significa o aminoácido metionina. Um novo código seria a descoberta de um organismo onde a seqüência ATG signifique o aminoácido leucina, por exemplo. Isto é um novo código.
Morse e a mensagem
Para se observar a imensa quantidade de notícias com uso incorreto do termo, seria de se esperar que fosse um termo muito restrito e difícil de ser encontrado. Mas não é. Qualquer livro de Genética ou Biologia Molecular traz a explicação sobre o código genético nos capítulos que tratam da síntese das proteínas. O processo é chamado, não por acaso, de "tradução". E também não é um termo novo, mas com pelo menos 50 anos de uso. Por que então a insistência na inexatidão?
Poderia se pensar que, como acontece com outros termos que foram incorporados pelos cientistas após uma ampla utilização pela população, os jornalistas estivessem apenas utilizando-se da terminologia já existente e aplicando-a às novidades publicadas pelos cientistas. Então precisamos recorrer aos dicionários e verificar o significado de código. De acordo com o dicionário eletrônico Michaelis, código é "um sistema lingüístico, pelo qual se transcreve ou traduz uma mensagem". O dicionário não informa que cada nova mensagem é um novo código, mas que código é um sistema pelo qual uma mensagem é traduzida. Podemos ilustrar.
Imagine uma situação de guerra. A inteligência de um determinado país intercepta uma seqüência de bips curtos e longos. Percebe-se logo que não se trata de bips aleatórios, mas de uma mensagem codificada. Por sorte, a inteligência reconhece que o código utilizado pelos inimigos é o código Morse. Assim, é possível traduzir a mensagem codificada para a língua do inimigo e, com um intérprete, traduzi-la para a língua nativa. A mensagem poderia dizer a que horas, por exemplo, haverá um ataque. Algumas horas depois, a inteligência recebe outra seqüência de bips. É outra mensagem codificada em código Morse. Será que nesta situação o jornal publicaria que a inteligência decifrou um novo código Morse vindo do inimigo? Ou a manchete diria que a inteligência decifrou uma nova mensagem vinda do inimigo?
Divulgação de qualidade
Pois bem. Cada seqüência de nucleotídeos do DNA de uma espécie é uma nova mensagem a ser decifrada, não um novo código. O código genético é universal, ou seja, é o mesmo para quase todas as espécies. Sendo assim, é adequado escrever que "as vítimas do acidente da TAM serão identificadas pelo código genético", como está escrito em uma notícia da época do acidente, em julho deste ano?
Nunca é demais repetir: a divulgação científica requer responsabilidade. É ela quem fornece ao público o embasamento que será utilizado em momentos de decisões importantes, como discussões sobre o aborto, organismos geneticamente modificados, uso de células-tronco, clonagem etc. São de responsabilidade do editor da área não somente os artigos escritos por seus jornalistas, mas também os traduzidos a partir de notícias do exterior, pois tais erros não são exclusividade de brasileiros.
É claro que não se pode esperar que um jornalista tenha conhecimento absoluto de todas as áreas científicas. Uma das soluções para minimizar tais erros é que os cientistas tenham um engajamento maior na divulgação científica de qualidade; outra opção seria a utilização mais acentuada de consultores especializados por parte da grande mídia. De qualquer forma, devemos continuar lutando por uma divulgação científica de qualidade, que forneça informações coerentes e corretas à população.
3. Divagação científica vs. divulgação científica
Por Moisés Viana em 11/12/2007
Li, neste Observatório, o artigo "Imprecisão e licença científica, o retorno”, dos professores e cientistas Rubens Pazza e Karine Frehner Kavalco – um texto interessante, atual e questionador.
Ao participar do I Seminário da Pesquisa em Comunicação da Região Sudoeste (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB, em Vitória da Conquista, BA), fiz uma reflexão sobre o discurso científico e a divulgação científica, incluindo o papel do jornalista como inter-mediador de discursos e, por isso mesmo, divulgador científico. Entende-se que os dois discursos estão em esferas diferentes e apresentam caracteres próprios a serem estudados profundamente. Para tanto, segui os passos teórico e prático do filólogo russo Mikhail Bakhtin e da pesquisadora Lilian Zamboni.
O primeiro aponta para necessidade de olharmos o discurso como espaço de interação social que se subdivide em gêneros, tipologias, universos que se inter-relacionam de maneira dinâmica e conflitante (incluindo assunto abordado, sujeito, público, composição léxica do discurso). E Zamboni esclarece, inteligente, sobre os discursos, científico e de divulgação científica.
Vive-se num tempo em que a ciência tem precedência e valor de verdade, um poder quase onipotente. Na atual conjuntura, ela determina ações e hábitos, justificando processo e dinâmicas humanas e os cientistas têm muito a dizer sobre seus estudos. Segundo Lilian Zamboni [Cientistas, Jornalistas e a Divulgação Científica: subjetividade e heterogeneidade no discurso da divulgação científica. Campinas: Fapesp/Editora Autores Associados, 2001], os cientistas constroem e vivem, comunicam-se no exercício de suas atividades sob um gênero de discurso, o científico.
Instrumento eficaz
Essa tipologia discursiva possui características próprias, dinâmicas e termos específicos acessíveis à comunidade científica (discurso do biólogo, discurso do físico, discurso do sociólogo, por exemplo). Eles se comunicam num processo discursivo sisudo, por jargões elaborados segundo regras rígidas e após exaustivos testes, exames, observações e práticas laboratoriais constantes. Ao se comunicarem fora do cotidiano para seus pares, eles, em geral, constroem um discurso bem calçado, com conceitos previamente discutidos e em consenso. Tudo para assim serem aceitos ou rejeitados, de acordo com a tendência ideológica da comunidade em que estão inseridos. Criam-se novos conceitos, rejeitam-se outros, reelaborando-se constantemente no interior desse gênero discursivo.
O discurso científico pertence à comunidade científica e para adentrá-la é preciso as provas de título, envolver-se e entrelaçar-se em suas dinâmica, em outras palavras, tornar-se cientista. Como salienta o filósofo Michel Foucault [FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: edições Loyola, 2003.], eles compõem um grupo privilegiado, instituído de qualificação para tal procedimento: criar um enunciado verbal e competente no assunto.
A fala científica se restringe nessa área e só entra quem for qualificado. Entretanto, eles não compõem um gênero de discurso fechado incomunicável, mas dialogam com outros discursos que se interconectam com os cientistas. Daí, a necessidade de haver uma divulgação científica, o instrumento eficaz dos cientistas para serem ouvidos fora de seus laboratórios, havendo assim progresso da ciência, subsídios financeiros e justificação ideológica das práticas de pesquisa.
Entre o céu e o inferno
Diferente desse gênero discursivo científico, o discurso de divulgação científica em seus diversos níveis (desde cientistas falando a outros cientistas em áreas distintas, cientistas falando para leigos, e leigos falando de ciência para outros leigos) assume-se num universo distinto; nele não se apresentam as falhas, as práticas cotidianas, mas apenas os resultados das pesquisas. Ele é uma nova reestruturação sofisticada para o público heterogêneo da sociedade, onde se diluem jargões, desaparecem conceitos, resumem-se resultados. Tal gênero apresenta e transforma o discurso científico em conteúdo divulgador, isto é, clareia as hipóteses e teorias da pesquisa científica para o público, aproximando-se lexicamente e simplificando, visando ao entendimento da população.
A descoberta de um novo medicamento, os avanços da genética, as novas aplicações do eletromagnetismo tornam-se parte do discurso social através da divulgação científica. Falar sobre ciência é, antes de tudo, colocá-la a serviço da sociedade, juntamente com sua aplicação prática, abrangendo temas que alcançam o cotidiano.
O discurso de divulgação é um discurso midiático, torna-se mediação entre os enunciados científicos e o público, mantendo um caráter universal e seus enunciados acessíveis a uma miríade de sujeitos discursivos. Ideologicamente, atua sobre a sociedade, a mente e os hábitos e cultura, escolhas econômicas e opções políticas.
Em resumo, a divulgação científica possui uma função legitimadora e explicadora do discurso científico, reformulando a ciência divulgada. Para tanto, o desafio é grande para o inter-mediador, que fica entre o céu e o inferno, ou seja, na terra, tramitando entre a divulgação e a divagação científica.
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NOTA DESTE BLOGGER:
Estamos de olho em vocês jornalistas científicos e a Nomenklatura científica atualmente mesmerizados pelas inconsistências paradigmáticas, e seguindo a máxima de Dobzhansky: As evidências, ora, que se danem as evidências, o que vale é a teoria!
Haja objetividade jornalística e científica. O nome disso é o que mesmo? Segundo Walter Ceneviva, articulista em jurisprudência da Folha de São Paulo, é descompasso com a verdade. Trocado em graúdos — desonestidade acadêmica e jornalística. Em nome do que? Da ciência? Ou da ideologia?