JC e-mail 4385, de 16 de Novembro de 2011.
Artigo de Eloi Garcia enviado ao JC Email pelo autor.
Nos últimos anos nosso laboratório vem trabalhando atividade com a flora digestivo do vetor da doença de Chagas e mostrando sua importância para o inseto e na regulação da infecção de Trypanosoma cruzi. Por isto entrei em contato com vários artigos científicos e alguns deles me chamaram a atenção: as bactérias do tubo digestivo será um novo sinal da biologia humana?
Os intestinos de cada pessoa contêm mais 100 bilhões de bactérias de diferentes espécies; isto representa mais do que o número de células existentes no indivíduo. É de imaginar que estes microorganismos auxiliam no processo digestivo, a destruir toxinas, a degradar fibras, a sintetizar vitaminas ou aminoácidos bem como proteger o ser humano de vários agentes patogênicos. Mas também tem aqueles que podem induzir doenças em quem os hospedam.
Toda a microbiota é semelhante entre diferentes pessoas? Ela vária com a idade, o sexo, a distribuição geográfica, a alimentação?
Trabalhos recentes revelam os tipos de bactérias que sempre estão presentes, mas em proporções distintas, são do gênero Bacteroides, Prevotella e Ruminococcus, sendo que cada uma delas associada a diferentes tipos de alimentos, como carboidratos, mucopolissacarídeos e açúcares. Uns produzem mais vitaminas enquanto outros aminoácidos, etc.
Pela análise de DNA por PCR e sequenciamento e as comparações com bases de dados pode-se identificar genes dos diferentes microorganismos presentes no tubo digestivo. Já foram identificados marcadores genéticos de várias bactérias. Alguns deles estão associados à idade, a massa corporal, obesidade ou doenças como o câncer de intestinal, por exemplo.
A flora intestinal nos acompanha pela vida afora. Mas, tem algumas características interessantes. Por exemplo, as pessoas idosas têm menos bactérias dos que as mais jovens, quando se trata dos microorganismos que reagem a estresses. Também se observa uma relação de maior quantidade de bactérias com genes que diminuem a obtenção de energia dos alimentos, diminuindo a chance de obesidade em alguns indivíduos.
Pretende-se investigar como se estabelece o equilíbrio entre as bactérias que habitam nosso tubo digestivo e como se mantém a harmonia com nossas necessidades. Em nosso modelo, o inseto vetor Rhodnius prolixus, que as bactérias mais beneficentes não são as mais abundantes, nem que as aderidas na parede intestinal demoram mais tempo para passar pelo aparelho digestivo e aparecer nas fezes.
É bem verdade que estes trabalhos estão apenas começando existindo agora mais dúvidas que respostas. A pergunta que fica no ar, sem resposta, é: porque, mesmo considerando a grande diversidade da microbiota intestinal, existem grupos de bactérias que convivem harmonicamente com os animais?
Eloi S. Garcia, ex-presidente da Fundação Oswaldo Cruz, é pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz, assessor da presidência do Inmetro e membro da Academia Brasileira de Ciência.