JC e-mail 4283, de 20 de Junho de 2011.
Maior universidade da América Latina trabalha agora para melhorar qualidade dos programas.
No ano em que completa 77 anos, a Universidade de São Paulo (USP), maior instituição de ensino superior da América Latina, comemora o total de 100 mil títulos de pós-graduação, entre mestrados e doutorados.
Como feito, agora a universidade se volta para a necessidade de discutir novos critérios para aprimorar a qualidade dos programas.
O número de 100 mil títulos se refere apenas aos trabalhos registrados após 1969, quando surgiram os padrões para a pós-graduação do País. Ficam de fora dessa contagem, portanto, inúmeras personalidades que obtiveram o reconhecimento acadêmico antes daquele ano, mas ajudaram a compor os cenários político, intelectual e científico do País, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, os literatos Antonio Candido e Alfredo Bosi, o economista Antonio Delfim Netto, o jurista Miguel Reale Júnior, o geneticista Crodowaldo Pavan e o cardiologista Adib Jatene, entre outros.
A universidade - que hoje abriga 56 mil estudantes de graduação e 22 mil de pós-graduação - realiza um grande evento em outubro, quando o marco simbólico dos 100 mil títulos será atingido. Do total, 53% são mestrados e 47%, doutorados. A unidade que mais produziu títulos - 9,5% - foi a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. "Os números, embora importantes, devem ser acompanhados por qualidade contínua e crescente", afirma o reitor da USP, João Grandino Rodas.
Segundo ele, "a tendência é exigir mais dos alunos, visando à formação ampla dos titulados".
Reflexão - O pró-reitor de pós-graduação Vahan Agopyan afirma que o momento é de reflexão. "Estamos com um modelo antigo, da década de 1960", destaca. "Precisamos nos questionar: queremos formar doutores só para alimentar a universidade ou para termos recursos de alto nível para o desenvolvimento do País?"
Até agora, nenhum pesquisador titulado pela USP faturou um Prêmio Nobel. Contudo, alguns já receberam homenagens equivalentes em áreas que não são contempladas pela academia sueca. O físico José Goldemberg, por exemplo, recebeu em 2008 o Blue Planet, principal homenagem aos benfeitores do meio ambiente. Dois anos antes, Paulo Mendes da Rocha recebeu o Pritzker, prêmio mais importante da arquitetura mundial. E o reitor João Grandino Rodas recorda que o principal candidato brasileiro a um Nobel é o neurocientista Miguel Nicolelis - um "uspiano" que não economiza críticas à própria USP.
Para os titulados, o marco de 100 mil trabalhos de pós-graduação guarda histórias e sentimentos de gratidão à universidade. "Tenho 30 anos de USP", conta o ministro da Educação, Fernando Haddad, que fez a graduação, o mestrado e o doutorado na área de Direito. "Eu me sinto, mais do que tudo, um uspiano. Entrei com 18 anos e nunca mais saí da USP - e ela também não saiu mais de mim."
A vida do geógrafo Aziz Ab'Saber também sempre orbitou ao redor da USP. Lá ele descobriu sua paixão pela geografia e se tornou uma referência, dentro e fora do Brasil, quando o assunto é impacto ambiental da ação humana. Recorda sorrindo que, em 1946, foi contratado como jardineiro pela universidade. A ideia foi de um professor. "Era um jeito de manter um pé na USP", afirma.
O casal Victor e Ruth Nussenzweig, responsáveis pelas principais descobertas que poderão levar a uma vacina contra a malária, iniciaram suas carreiras na Faculdade de Medicina da USP. Lá, fizeram o doutorado. Victor recorda a grande liberdade de que gozavam para pesquisar em uma faculdade ainda em criação. "Não tive um orientador de doutorado", recorda. "Naquela época, a tese dependia muito mais do aluno."
Professores pioneiros dão valor à titulação - Os professores que detêm os primeiros títulos registrados após 1969 destacam a importância que a titulação teve em suas vidas profissionais. "A comemoração das 100 mil teses da USP demonstra que desde seu início houve a criação de um ambiente fértil de pesquisa, o que propiciou a formação e o desenvolvimento de um grande número de pesquisadores e de alunos de iniciação científica, mestrado e de doutorado em todas as áreas do conhecimento", destaca o professor Hildebrando Rodrigues.
Ele ainda dá aulas e orienta alunos. Rodrigues apresentou seu mestrado na área de matemática no campus de São Carlos em novembro de 1970. O estudo investigava equações diferenciais. O segundo titulado, que obteve o título de mestre uma semana após Rodrigues com uma pesquisa na área de recursos hídricos, saiu da USP depois de 33 anos. Hoje, Arthur Mattos é professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). "A pós foi fundamental na minha vida", considera.
Mattos destaca que o desenvolvimento da pós-graduação na USP teve grande apoio das agências de fomento. "Em São Paulo, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) é essencial. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) também é muito aparelhado e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) é fundamental."
(O Estado de São Paulo - 19/6)