Garanto para você que os jornalistas científicos tupiniquins não noticiaram sobre esta grande novidade científica. Razão? Eles operam sob o paradigma ricuperiano: “O que Darwin tem de bom, a gente mostra; o que Darwin tem de ruim, a gente esconde.”
Desde quando Watson e Crick determinaram a estrutura do DNA [1] o “dogma central” da genética é a informação genética flui numa só direção — do gene para a proteína.
Atenção MEC/SEMTEC/PNLEM, especialmente a comissão de análise dos livros-texto de Biologia do ensino médio: nossos livros didáticos hoje afirmam, baseados em conhecimentos atuais, que um gene deveria ser uma extensão finita de DNA que, quando lido pelo processo de tradução, produz o mRNA (o RNA mensageiro) que recrutava os RNAs de transferência para a formação de aminoácidos de uma proteína.
Bem, em ciência é assim: por ser um construto humano, é limitada e sujeita a modificações pelas novas descobertas. Nada como um dia atrás do outro em ciência, pois a verdade científica de hoje pode ser demonstrada falsa amanhã. Só que eu não vi isso destacado na Grande Mídia tupiniquim (saiu na Folha de São Paulo???), nem no JC E-Mail e tampouco no boletim Agência FAPESP. Você viu? Eu não vi: “O gene morreu... vida longa ao gene”, foi assim anunciado num artigo da Science News da semana passada.
Os geneticistas chegaram à uma conclusão surpreendente ao longo dos últimos anos: os genes não são as coisas mais importantes no DNA, mesmo que eles existam somente como um conceito. Patrick Barry descreveu no seu artigo que a situação nas células é muito mais complicada. “Montanhas de novos dados estão desafiando visões antigas” foi o anúncio do seu subtítulo, inclusive a “ortodoxia moderna” de que somente os genes são importantes.
“Os pesquisadores chegaram à conclusão aos poucos de que os genes ocupam somente cerca de 1.5% do genoma. Os outros 98.5%, chamado de “DNA lixo” foi considerado como sendo restos inúteis deixados para trás ao longo de bilhões de anos de mutações genéticas aleatórias. Na medida em que o conhecimento dos geneticistas progredia, este quadro básico permaneceu grandemente inquestionável...
Um exame mais detalhado de todo o genoma humano está forçando agora os cientistas a voltarem fazer algumas perguntas que eles pensaram ter resolvido. Só uma delas: os cientistas estão revisitando a própria noção do que seja um gene.”
Uau, é por isso que sou fanático pela ciência, de carteirinha: aqui e ali a galera dos meninos e meninas de Darwin caem do cavalo da “arrogância epistêmica luciferiana”. Vejam algumas das descobertas feitas na atual era genômica:
1. O genoma humano tem muito menos genes do que esperado.
2. Alguns animais “inferiores” têm o mesmo número de genes que os humanos.
3. A maior parte do genoma humano não codifica para os genes.
4. O código para proteínas pode ser dividido entre partes distantes do genoma — até em cromossomos diferentes.
5. O DNA não-codificante, há pouco tempo considerado pelos darwinistas como sendo “DNA lixo”, está na verdade altamente envolvido na regulação de gene.
6. A genética age mais como uma rede do que uma biblioteca estática de genes.
7. O RNA é muito mais do que um simples mensageiro na célula. Numerosas pequenas transcrições de microRNA estão fortemente envolvidos na regulação de expressão gênica, e superam as transcrições gênicas.
8. Alguns genes coincidem em parte com os códigos de microRNAs ou elementos de regulação.
9. Os genes podem ser lidos de múltiplas maneiras podem resultar em muito mais do que somente uma proteína (é o chamado “splicing alternativo”).
10. As transcrições do RNAm sofrem modificação e regulação significantes no núcleo.
11. O processo de tradução pode até resultar em transcrições do filamento oposto. O artigo de Barry fornece um bom resumo de numerosos artigos que vêm colocando sérias dúvidas sobre o Dogma Central, e até no próprio conceito de um gene.
Para quem já leu Popper, Kuhn, Feyerabend, e Lakatos percebe que isso se trata de um clássico exemplo de mudança paradigmática acontecendo diante de nossos olhos: mudança paradigmática em ação, para desespero dos materialistas que seqüestraram o naturalismo metodológico para promover a agenda do seu materialismo filosófico que posa como se fosse ciência. Nada mais falso!
E aí, gene, [não é GENTE, é GENE mesmo] como é que fica? Você existe? Você é uma realidade física? Ou é meramente uma figura que os humanos impuseram sobre uma realidade muito mais sutil do que a nossa vã filosofia e ciência podem explicar?
Eu não quero parecer iconoclasta demais do que sou, mas o Crick e o Watson vão quebrar a cara: parece haver mais processamento de informação numa célula do que a famosa dupla de ladrões de idéias, oops cientistas imaginou. Gente, nós estamos vivendo dias emocionantes para a ciência, e extremamente complicadores para os ultradarwinistas à la Dawkins, Dennett et caterva. Só um aviso: não espere essa turma sentir remorso por terem conduzido a humanidade numa ortodoxia epistemológica que a cada dia se mostra falsa.
Eu queria ver a cara do Dawkins, o biólogo do gene egoísta, oops zoólogo. A Companhia das Letras não vai mesmo fazer o recall do livro que o chama, falsamente, de biólogo? Razões? É preferível ter um comportamento aético com os leitores do que sofrer um baita prejuízo econômico. Schwarcz, você não sabe o prejuízo moral que a Companhia das Letras está sofrendo em termos de credibilidade pelo seu silêncio pétreo nesta questão. Por que sofrer isso pelo Dawkins? Cientista evolucionista brasileiro de renome me confidenciou outro dia numa conferência: “Enézio, o Dawkins está defasado em conhecimentos biológicos, e não reflete o consenso acadêmico sobre questões defendidas no seu último livro”.
Dawkins, a estória do “gene egoísta” era papo reducionista furado, não era???
[1] SPC — Só prá contrariar: fonte segura em história da ciência informa que vem chumbo grosso contra a dupla no “affair” (não foi roubo escancarado de idéias???) das pesquisas de Rosalind Franklin sobre o DNA.