24/2/2010
Por Fábio de Castro
Agência FAPESP – Um grupo de pesquisadores paulistas vem aprimorando, desde a década de 1990, metodologias para a descoberta de catalisadores biológicos, fundamentais para o desenvolvimento de fármacos mais eficientes e seguros.
Encerrado em dezembro de 2009, o Projeto Temático “Biocatálise em síntese orgânica” é o terceiro coordenado desde 1999 por José Augusto Rosário Rodrigues, professor do Instituto de Química (IQ) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Pesquisadores da Unicamp aprimoram, com apoio da FAPESP, metodologias para a descoberta de biocatalisadores, fundamentais para o desenvolvimento de fármacos mais eficientes e seguros. Na imagem, a levedura Saccharomyces cerevisiae (Foto: IQ-Unicamp)
Os catalisadores, substâncias que afetam a velocidade de reações químicas, são um insumo importante para a produção de fármacos. Mas, de acordo com Rodrigues, para evitar a toxicidade dos catalisadores químicos, os cientistas foram buscar, nas células de microrganismos como fungos e bactérias, enzimas de interesse – os biocatalisadores.
“Cada tipo de produto farmacológico precisa de um catalisador específico para realizar uma determinada reação. Por isso, temos nos dedicado a descobrir metodologias cada vez mais sofisticadas para a triagem de enzimas de interesse”, disse Rodrigues à Agência FAPESP.
As metodologias desenvolvidas buscam unir dois aspectos: alto rendimento e pureza óptica elevada. “Fazemos triagens com diferentes microrganismos para avaliar quais são os que têm melhor rendimento e os que têm atividade óptica, ou quiralidade – uma propriedade da molécula que garante sua não-toxidez”, explicou.
Os isômeros ópticos ou quirais – isômeros são compostos que possuem os mesmos constituintes atômicos, mas cujas disposições na molécula são diferentes, conferindo características diversas – desviam a luz polarizada, afetando a toxidez do produto.
“Os centros receptores do nosso organismo também são quirais. É preciso que o fármaco tenha complementaridade com eles para que seja reconhecido pelo organismo. Além disso, os novos fármacos só são aprovados pelas agências internacionais de controle quando a toxidez é comprovadamente baixa”, afirmou.
Uma das principais vantagens do uso de biocatalisadores no lugar dos catalisadores químicos, segundo Rodrigues, está no impacto ambiental. “Os catalisadores químicos são, em geral, muito agressivos para o meio ambiente. Os biocatalisadores não geram resíduos difíceis de descartar. O uso de um insumo natural como esse tem um apelo ambiental enorme, que pode determinar o sucesso comercial de um produto”, explicou.
Os biocatalisadores podem ser considerados uma aplicação da “química verde” – um conjunto de diretrizes voltado à redução do impacto ambiental dos processos químicos. “Um produto verde contorna a aversão do consumidor pelos produtos químicos. Por isso, os biocatalisadores geram grande potencial de mercado”, disse.
Outra vantagem é que, ao contrário dos catalisadores químicos, para executar as reações os biocatalisadores não precisam de temperaturas drasticamente elevadas. “As enzimas atuam em geral nas condições do ambiente. Esse é mais um motivo para que os biocatalisadores sejam usados como princípio ativo dos fármacos”, apontou Rodrigues.
Da bancada para o mercado
O refinamento das metodologias conseguido com os três Projetos Temáticos, de acordo com Rodrigues, está sendo aproveitado em outras pesquisas. Uma delas é o projeto “Desenvolvimento de rotas para obtenção de ácido acrílico e ácido propiônico por processo fermentativo a partir de açúcares”, coordenado por Rubens Maciel Filho, também do IQ-Unicamp, e conduzido no âmbito do Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN).
O projeto foi um dos cinco selecionados na primeira chamada do acordo de cooperação entre FAPESP e Braskem, assinado em 2008. “Esse projeto vem sendo desenvolvido, na prática, há dois anos. As metodologias que aprimoramos utilizando nossa coleção de microrganismos estão sendo utilizadas com sucesso. A diferença é que no Projeto Temático trabalhamos mais com fungos. No projeto do BIOEN, usamos bactérias”, explicou Rodrigues.
O Temático também gerou um pedido de patente para um biocatalisador baseado no uso de microrganismos e fermentação. Para isso, Rodrigues teve apoio do Programa de Apoio à Propriedade Intelectual (PAPI) da FAPESP. “A patente está sendo requerida no mercado mundial. Além disso, temos desenvolvido diversos projetos de interesse industrial na área de polímeros”, disse.
O professor da Unicamp acrescenta que os Projetos Temáticos também geraram diversas teses defendidas e artigos publicados. “Os projetos tiveram grande impacto na formação de pessoal. Há grande demanda, nas empresas, por químicos treinados na triagem e síntese de enzimas”, apontou.
O potencial de transferência de conhecimento na área de biocatalisadores é muito grande, segundo Rodrigues. “Temos procurado desenvolver produtos que possam ser sintetizados e preparados não apenas em escala de laboratório, mas em escala capaz de atender às necessidades da indústria farmacêutica”, disse.