Scientific American-Brasil – uma verdadeira aula de história da ciência e de liberdade acadêmica

quarta-feira, outubro 25, 2006

Fui assistir ontem à noite (24/10) às 19:00, na Livraria Cultura, Conjunto Nacional na Av. Paulista, São Paulo, SP, ao lançamento da edição especial da revista Scientific American-Brasil História “Os Grandes Erros da Ciência”.

Houve primeiro uma palestra pelo Prof. Dr. Roberto de Andrade Martins (Instituto de Física Gleb Wataghin, UNICAMP), intitulada “A Torre de Babel Científica” (disponível nesta edição especial).

Pena que eles cobriram tão-somente erros da ciência do passado. Eu ia sugerir uma outra edição sobre os erros modernos da ciência quando um professor da USP (crítico ferrenho da atitude fossilizada dos defensores intransigentes dos paradigmas vigentes) fez a sugestão. Fui até ele e disse que eu ia sugerir isso, mas que tinha ficado bastante honrado porque alguém mais capacitado academicamente do que eu tinha feito a sugestão: Prof. Dr. Valdemar W. Setzer, do IME da USP.

Saí do evento com uma cópia da revista Scientific American-Brasil, contente da vida porque ela servirá para quebrar muitos preconceitos e atitudes epistêmicas fossilizadas de grande parte da Nomenklatura tupiniquim. E calar a boca dos meninos da galera ultradarwinista. Ou abrir as suas mentes – essa a minha esperança maior.

Transcrevo abaixo o editorial que vale como uma verdadeira aula de história da Ciência e de liberdade acadêmica. Corra, vá à banca mais próxima e compre o seu exemplar. IMPERDÍVEL!!!

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O território e o mapa


A aventura do conhecimento é um processo assintótico infinito. Assintótico porque nos aproximamos, cada vez mais, da meta planejada. Infinito porque jamais a alcançamos. Por melhores que sejam nossas representações da realidade, o real, ele mesmo, encontra-se sempre um passo adiante. E, sucessivamente desvelado, ainda esconde, sob incontáveis véus, sua fugidia nudez.

A aventura do conhecimento é um processo errático e dissipativo. A frase que inicia o parágrafo anterior talvez seja, também ela, uma imagem falsa – ou, no melhor dos casos, apenas meia verdade. Pois sugere uma linearidade, um caráter necessariamente progressivo, que a empreitada do conhecimento, de fato, não tem. Caminhamos às apalpadelas. E os conceitos que construímos ontem, e descartamos hoje com desdém, talvez tenham de ser retomados amanhã, em uma nova curva da espiral evolutiva. O escritor Arthur Koestler comparou a atividade científica ao sonambulismo, demonstrando, com exemplos superlativos, que o avanço da ciência ocorreu, muitas vezes, a despeito das mais caras convicções dos seus protagonistas ou até mesmo contra elas.

A impossibilidade de atingir a verdade absoluta é inerente à atividade racional, e repousa na dicotomia entre o sujeito (o observador) e o objeto (o observado) – dicotomia que se mantém mesmo quando o objeto em pauta é a própria subjetividade. Enquanto persistir a mais tênue barreira entre o observador e o observado, a ciência será sempre uma obra inacabada, precária, provisória. Por isso, na práxis científica, o erro é a regra e não a exceção, um constituinte fundamental e não mero acidente de percurso. Por isso, também, a reflexão sobre o erro nos ensina mais sobre a natureza da ciência do que a exaltação triunfalista de seus êxitos.

Dedicada a grandes erros, cometidos por grandes cientistas, esta edição posiciona-se claramente a favor da ciência, e não contra. A ciência não é apenas uma atividade vital para a sobrevivência e o desenvolvimento da humanidade. É também uma das mais belas produções da inteligência humana. Mas somente a aceitação de seu caráter limitado, parcial e incerto pode impedir que se transforme em um fossilizado sistema de crenças.

Na concepção e execução deste número especial de SCIENTIFIC AMERICAN, inteiramente produzido no Brasil, contamos com a inestimável colaboração de Roberto de Andrade Martins, considerado, com justiça, um dos maiores historiadores da ciência do país. A ele e a todos os autores que, sob sua competente coordenação, tornaram esta edição possível, nossos sinceros agradecimentos.

José Tadeu Arantes, editor
Scientific American-Brasil