Impactos do fator de impacto: o darwinismo aplicado ao fomento à ciência

quarta-feira, agosto 18, 2010

JC e-mail 4077, de 18 de Agosto de 2010.


"A comunidade científica tem que responder à crescente demanda por informações em pouquíssimo tempo, não podendo se dar ao luxo de delegar suas questões às gerações futuras"

Ruy José Válka Alves é professor do Departamento de Botânica do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), do qual foi vice-diretor. Artigo enviado pelo autor ao "JC e-mail":

A ciência deve estar, acima de tudo, a serviço da humanidade. Assim, os trabalhos científicos "mais fortes" seriam selecionados em detrimento dos mais fracos, por aqueles aos quais cabem tais decisões.

Idealmente, a citação bibliográfica das obras científicas demonstra apenas que um autor não ignora determinado trabalho. A mera citação de uma obra nunca revela se esta é bem ou mal elaborada. Quando muito, ao citarem a obra, os autores expressam, de maneira tecnicamente embasada, suas opiniões sobre o trabalho.

Mas com o advento do sistema de citações, a exemplo do fator de impacto etc., o mundo científico embarcou numa viagem da fantasia, em que qualquer citação passou a contar como ponto positivo. Não demorou muito e a lógica dessa ação entrou em metástase, criando um pensamento circular: as citações em periódicos mais citados valem mais pontos do que as citações em periódicos menos citados. Em pouco tempo muitos periódicos científicos tradicionais ficaram em séria desvantagem nas avaliações, em função do citacionismo. Ironicamente, não há nenhuma ligação comprovada entre a qualidade dos artigos científicos e dos periódicos.

Mas os economistas não dormiram no ponto: vendo o gargalo criado pelo "impacto" usaram a oportunidade para gerar o poder de escolher entre os candidatos a apoios. Os mais citados em periódicos frequentemente citados e citáveis, tornando-se assim os mais criticados, vencem as concorrências, ganham bolsas e "grants". Com isto, tornam-se mínimas as chances de pesquisadores não citados, ou citados em fontes fora da "Lista de Schindler" obterem apoios de órgãos de fomento oficiais.

Citar ou não um artigo científico se tornou um ato de poder político. Citam-se os dos amigos e parceiros. O "azar" vai aos que ficaram de fora dessas categorias, e se reflete em chances artificialmente reduzidas para qualquer apoio.

Assim, em muitas áreas, tornou-se extremamente comum cientistas, em seus artigos, omitirem informações dos seus pares, mesmo que publicadas, com a clara intenção de não beneficiar seus "concorrentes". Na guerra por pontos, bolsas de pesquisa, verbas de editais, "grants" etc., tal prática chegou ao cúmulo do ridículo. Mesmo tendo recebido separatas por correio e, nas últimas décadas, por e-mail, os "grupos de excelência" continuam ignorando os trabalhos alheios, por mais excelentes que estes últimos realmente sejam.

Desvirtuou-se assim o compromisso que a ciência deveria ter para com a verdade. Agora, tal compromisso é com as aparências. Mas poucos se tocam: assim, não podemos mais falar de ciências, tampouco de consciências.

Com essa guinada de valores, o conteúdo real de um trabalho ficou em segundo plano. Se ele será útil à Humanidade, não mais importa aos que decidem. Quem decide se você ganha uma bolsa ou verba para pesquisa não vê o valor do trabalho técnico, mas um número de pontos gerado por uma imbecilidade artificial: o sistema de impacto e seus derivados.

Se desejarmos que haja avanços na ciência, educação e cultura deste mundo, do qual o Brasil é um parceiro significativo, temos que começar com uma atitude contundente, descreditando o sistema de avaliação de cientistas e periódicos em vigor e, num futuro próximo, criando um modo mais eficaz para realizar tais avaliações, que seja independente dos modismos ora vigentes.

A seleção de trabalhos científicos bons por um método linear e pasteurizado nem sempre será possível, pois a vastidão da ciência em muito supera a nossa capacidade de previsão. Às vezes a utilidade de um trabalho será imediata, e noutros casos será potencial, o que, aos menos imediatistas, não reduzirá o valor do trabalho em apreço.

Conhecendo vários casos concretos que embasam este artigo preliminar, me ponho, desde já, à disposição de potenciais colaboradores para um estudo que venha a relatar, de modo imparcial, casos icônicos do mencionado acima.

De fato, o darwinismo não se aplica aqui, pois a comunidade científica tem que responder à crescente demanda por informações em pouquíssimo tempo, não podendo se dar ao luxo de delegar suas questões às gerações futuras.

Mas já seria muito positivo se conseguíssemos admitir a existência dos problemas aqui expostos, gerando mais luz do que atrito.

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NOTA DESTE BLOGGER:

Há muito tempo venho denunciando o atual sistema de revisão por pares, especialmente no que diz respeito às novas ideias, hipóteses e teoria científicas: como verdadeiros guardas-cancelas, os revisores impedem as publicações de artigos que contrariem os paradogmas da Nomenklatura científica.

E o que dizer do silêncio pétreo das Nomenklaturas científicas internacional e tupiniquim no que diz respeito às insuficiências fundamentais nas atuais teorias da origem e evolução do universo e da vida? Ninguém fala, ninguém viu. A Grande Mídia então vive uma relação incestuosa com a Nomenklatura científica, pois nada publica e nem questiona os cientistas como deveria mediante ceticismo saudável às suas declarações ex-cathedra.

Dr. Ruy, que tal começar por aqui? Eu sei do que estou falando!

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