Pacotes perfeitos

sexta-feira, fevereiro 05, 2010

5/2/2010

Por Fábio Reynol

Agência FAPESP – Papel, madeira, aço, tecido, vidro e vários outros setores industriais se deparam diariamente com problemas de corte e empacotamento. Clientes diferentes, produtos diversos e itens de formatos variados que devem ser cortados, empilhados, embalados e dispostos em contêineres para transporte são apenas alguns fatores que influenciam diretamente na produtividade dessas empresas.




Projeto Temático conduzido na USP em São Carlos busca soluções para problemas de corte e empacotamento, otimizando processos industriais de vários ramos (divulgação)

Foi pensando nesses problemas que o professor Marcos Nereu Arenales, do Departamento de Matemática Aplicada e Estatística do campus de São Carlos, da Universidade de São Paulo (USP), juntamente com um grupo de outros pesquisadores, iniciou, em dezembro de 2006, o Projeto Temático “Teoria e prática de problemas de corte e empacotamento”, apoiado pela FAPESP.

No projeto, que se encerra este mês, foram estudados problemas de corte e empacotamento e desenvolvidos algoritmos para resolver problemas clássicos e novos de diferentes setores industriais.

“Como as especificidades são muito grandes para cada empresa, não há como produzir um modelo matemático e um método de solução para todas”, disse Arenales à Agência FAPESP.

A ferramenta empregada foi a abordagem por otimização matemática – otimização linear, otimização inteira e combinatória, otimização não linear, entre outros –, que pode ser resumida como a formalização do problema por meio de sistemas de equações e inequações e um objetivo a ser otimizado. Por exemplo, minimizar perdas, custos e atrasos ou maximizar lucros.

“Em um momento tentamos aplicar um algoritmo desenvolvido para o corte de bobinas de papel na solução do problema similar de minimizar desperdícios no corte de bobinas de aço na indústria metalúrgica e não funcionou. Os resultados foram bastante insatisfatórios”, disse Arenales.

“Isso nos levou a propor diferentes modelos matemáticos que captassem o processo de corte do novo problema e o desenvolvimento de novos algoritmos. Essa é a atitude frequente dos pesquisadores do grupo”, disse, ressaltando os desafios, a começar pelas variáveis envolvidas que são da escala de centenas de milhares.

Em uma fábrica moveleira, por exemplo, as placas de madeira devem ser cortadas em tamanhos diferentes segundo os projetos, visando a minimizar sobras e ociosidade de máquinas. Mas não é só isso.

É preciso, entre muitos pontos a levar em consideração, que os processos de corte se ajustem ao cronograma de produção e de encomenda de cada cliente, que o estoque de peças intermediárias seja controlado e que as peças cortadas sejam adequadamente empilhadas para que não entulhem nas instalações.

Esses exemplos ilustram bem o significado da chamada pesquisa operacional, que consiste em um conjunto de teorias e técnicas para o uso racional de recursos limitados.

Para lidar com a complexidade de tais problemas, os algoritmos que apresentam soluções exatas demorariam muito tempo para serem executados, tempo inviável para as empresas. Por conta disso, os especialistas lançam mão de heurísticas, métodos de solução que, em vez de apresentar resultados exatos, retornam soluções aproximadas em um tempo de computação interessante ao mercado.

Qual seria a melhor solução: utilizar latas cilíndricas ou retangulares para embalar óleo de soja? Arenales costuma colocar esse exemplo para ilustrar um problema de corte e empacotamento (PCE) clássico. Não há uma resposta ideal.

“Se por um lado as embalagens cilíndricas utilizam menos metal em sua confecção, de outro as retangulares ocupam melhor o espaço de uma caixa na hora de embalar. Com latas cilíndricas, por exemplo, acaba-se armazenando e transportando muito mais espaços vazios”, explicou.

Segundo ele, respostas para questões como essa devem vir das peculiaridades de cada setor e de cada empresa. Perde-se de um lado, ganha-se de outro.

Soluções na academia

O trabalho dos pesquisadores está tão ligado às aplicações industriais que por diversas vezes a equipe de Arenales foi contatada por empresas que tomaram conhecimento do Projeto Temático.

Um funcionário da metalúrgica Brasmetal leu um artigo gerado pela pesquisa do grupo de Arenales na revistaPesquisa Operacional. O professor foi procurado pelo profissional que identificou no texto científico uma solução para problemas enfrentados pela empresa. Arenales indicou a empresa Unisoma, que já foi parceira de projetos anteriores, para fazer a interface do conhecimento gerado.

“A aplicação e a adaptação comercial não são funções da universidade”, explicou. Essa ponte é feita por empresas como a Unisoma que prospectam trabalhos desenvolvidos em instituições de pesquisa e fazem adaptações para que sejam utilizados por empresas.

“Não vamos buscar soluções na universidade, mas um ferramental que possamos usar para desenvolver essas soluções”, disse Luciano de Moura, diretor técnico da Unisoma. Não há como demandar soluções à universidade, segundo ele, porque os prazos da indústria são muito mais curtos que os da academia.

Como exemplo, Moura cita um cliente que o contratou para desenvolver um aplicativo para otimizar um empacotamento para transporte. “Quebramos a cabeça para desenvolver uma solução e, cerca de dois anos depois, o grupo do professor Arenales publicou um artigo sobre o assunto com informações que teriam poupado muito do nosso trabalho”, contou.

A otimização proporcionada pelas ferramentas de PCE consegue reduzir custos, diminuir tempo de produção, encolher perdas e aumentar lucros. Por isso as empresas têm se preocupado cada vez mais com o assunto, segundo o diretor da Unisoma.

“Desde meados do ano passado, fomos procurados por cinco empresas que buscavam soluções relacionadas a problemas de corte e empacotamento”, disse Moura, ressaltando que antes os PCEs eram uma demanda que aparecia esporadicamente.