De olho no escuro

terça-feira, agosto 11, 2009

De olho no escuro
11/8/2009

Por Washington Castilhos

Agência FAPESP – Daqui a cerca de 4 bilhões de anos o Sol será uma preocupação ainda maior para os habitantes do planeta Terra, aponta o astrofísico Kepler de Souza Oliveira Filho, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

O motivo é que, quando acabar o hidrogênio do Sol, ele irá se expandir, levando a temperatura na superfície terrestre a cerca de mil graus centígrados, segundo estimativa feita em 1919 e ainda válida.

“Vale lembrar que o ser vivo mais resistente na Terra resiste a menos de 700ºC. Até lá, a água vai ter evaporado. A pergunta é: para onde iremos?”, disse ele durante a 27ª Assembléia da União Astronômica Internacional (IAU, na sigla em inglês), que está sendo realizada no Rio de Janeiro até sexta-feira (14/8).


Segundo o astrofísico Kepler de Souza Oliveira Filho, desvendar mistérios do Universo, como a energia e a matéria escura, é essencial para garantir o futuro da humanidade (Nasa)

Segundo Kepler, a despeito das expectativas, em Marte a temperatura poderá ainda não estar aceitável, mesmo com tanto tempo. “Temos que achar um outro planeta rochoso. E nenhuma fonte de energia atual é capaz de nos levar até um planeta fora do Sistema Solar”, disse à Agência FAPESP.

A saída seria desvendar mistérios do Universo. “O Universo é composto por 4% da matéria que conhecemos (feita de prótons, elétrons, etc), 24% de matéria escura e 72% de energia escura, também chamada de a quinta essência, a qual ainda não conhecemos”, explicou.

Para o cientista batizado com o nome do astrônomo alemão Johannes Kepler (1571-1630), descobrir o que é a energia escura poderá ajudar a conhecer o que irá ocorrer com o Universo e quando, mas não mudará o destino terrestre.

Por sua vez, a descoberta da matéria escura poderá levar os humanos a outras fontes de energia, que, eventualmente, ajudarão nas viagens para planetas distantes. Tudo estaria interligado e primeiro seria necessário desvendar o mistério da energia escura para então descobrir o que é a matéria escura. “Temos que descobrir precisamente quando, para, então, planejar o que fazer”, salientou.

A equipe de Kepler tem se dedicado a medir a idade de estrelas mais velhas. “As estrelas esfriam quando seu combustível nuclear [processo de transformação do hidrogênio em hélio e depois em carbono] acaba”, disse.

“A reação nuclear só ocorre em temperaturas acima dos 10 milhões de graus centígrados. Elas estão quentes e depois esfriam. Medimos, então, o tempo que leva para uma temperatura esfriar até a temperatura das estrelas mais velhas, que é de 1 milhão de graus centígrados no interior e de 3 mil graus centígrados do lado de fora. Para ter uma ideia, o Sol tem 15 milhões de graus em seu interior e 6 mil do lado de fora”, explicou.

Velhas estrelas

Por meio da mensuração da idade das estrelas mais velhas – uma outra maneira de se chegar à idade do Universo –, há 20 anos Kepler publicou artigo em que sustentava que o Universo tinha cerca de 12,1 bilhões de anos.

A idade estava relativamente próxima à mais aceita atualmente, de 13,5 bilhões de anos, estimada em 2001 pelos astrônomos Wendy Freedman, Robert Kennicutt e Jeremy Mould, a partir de extensas observações com o telescópio espacial Hubble.

Kepler, membro do comitê organizador nacional da Assembléia da IAU, conta que a área de astronomia está crescendo no país, mas os investimentos ainda são pequenos.

“O Brasil paga para usar 2,5% do tempo do telescópio Gemini, o que representa apenas 18 noites por ano para todos os cerca de 500 astrônomos brasileiros envolvidos. Os astrônomos que descobriram a idade do Universo usaram centenas de noites do Hubble para chegar a essa constatação”, disse o professor associado no Instituto de Física da UFRGS.

Ele frisa que a tecnologia é cara e a astronomia é uma ciência que não dá retorno monetário, razão pela qual o Brasil não tem um telescópio como os Gemini – os dois telescópios de infravermelho mais poderosos da Terra, construídos um em Cerro Pachón (Chile) e outro em Mauna Kea (Havaí), – do qual o país é parceiro.

“Um telescópio tem que ser grande e capaz de medir, a partir daqui, o equivalente ao tamanho de uma moeda de R$ 0,5 na Lua. O Gemini, que custou US$ 250 milhões, faz isso”, disse.