VEJA: Uma mentira sem fim em nome de Darwin – Parte 2 de 3

sexta-feira, maio 11, 2007

Eu não tenho procuração de nenhuma tradição religiosa, mas vou fazer aqui o papel do Advogado do Diabo deles neste especial da VEJA de matiz enviesado, ‘feito nas coxas’ em termos de História da Ciência, tendo por pano de fundo uma agenda estritamente materialista como sendo a única visão descritiva da realidade e, acima de tudo, pruridamente anti-religioso.

Sem dúvida que a hipótese de “evolução lenta das espécies ao longo das eras formando linhagens que desembocam nos atuais seres vivos” seja o Darwin, ninguém discute. Só que a maior de todas as idéias que a humanidade já pensou, não é original com Darwin. Até os povos primitivos já tinham esta idéia. O que se vem discutindo intramuros na Akademia desde 1859 é COMO isso se deu, se dá, e se dará conforme preconizado pelas hipóteses transformistas de Darwin. Embora não saibamos até hoje o COMO isso se deu, se dá, e se dará, o KONSENSO da Nomenklatura científica é que a evolução é um fato, Fato, FATO cientificamente inconteste.

Carelli e Camargo foram especiosos em pinçarem tão-somente a “versão religiosa segundo a qual por volta do ano 4004 a.C., de uma só tacada, Deus criou o homem, a mulher e os demais seres vivos exatamente como eles são agora” quando havia e há até hoje outras versões de concepções religiosas. Eu não consigo entender o porquê desse temor escatológico deles quanto à “visão pré-darwinista” sobrevivente apenas dentro dos guetos e catacumbas religiosas, ter conseguido “uma projeção assustadora”. Quem são esses “fundamentalistas”? Seriam eles comedores de inocentes criancinhas darwinistas? Por que não os identificaram para nós tomarmos o devido cuidado com eles, e serem postos fora de circulação uma vez por todas já que são diferentes?

Ora, Carelli e Camargo, vocês perderam boa oportunidade de relatar no seu especial que eles ainda estão por aí por causa do conceito darwinista da “sobrevivência do mais apto”. Ou dos “memes dawkinsianos”. Pressão seletiva do meio ambiente através de uma mutação “SUED” que se instalou na população na Idade do Gelo. Drawink teve um insight brilhante – talvez Dawkins esta seja a melhor idéia que a humanidade já teve − de que seria melhor para o seu grupo “acreditar” em SUED, invisível e inexistente, mas que lhes concederia a adaptação evolutiva necessária para sobrevivência. Isso é Drawink.

À luz desse retrocesso jornalístico imoral, relembrar as relações incestuosas da Grande Mídia tupiniquim com a Nomenklatura científica quanto às insuficiências epistêmicas do darwinismo torna-se mais do que um imperativo. Torna-se uma luta pelo restabelecimento da scientia qua scientia: EMPIRICA, EMPIRICE TRATANDA [As coisas empíricas são consideradas empiricamente]. Eu faço isso desde 1998 junto às editorias de ciência das melhores revistas e jornais do Brasil. Em vão, porque o que vale em cada redação tabajara é a máxima de Marcelo Leite: “Não damos espaço.” Quer dizer, o incesto praticado à luz do dia, oops nas rotativas é “O que Darwin tem de bom, a gente mostra; o que Darwin tem de ruim, a gente esconde.”

Onde a dupla “Carelli e Camargo” aprendeu que foi tão-somente quando Darwin lançou A Origem das Espécies (1859), tentando explicar a teoria da evolução, que os “cientistas e intelectuais de todos os matizes foram obrigados a se posicionar diante dos argumentos do naturalista”? A História da Evolução 101 me informa o contrário. Antes de publicar o seu livro (Ernst Mayr disse que o livro era confuso e não explicava o que o título propunha − a origem das espécies), Darwin, que não tinha formação acadêmica em nenhuma ciência, mas apenas em teologia, dialogava com a comunidade científica do seu tempo discutindo as suas hipóteses. Eles fizeram muitas objeções científicas a ponto de Darwin ser obrigado a lidar com elas, e alocar 30% de espaço na sua obra tentando refutá-las. Não conseguiu, apesar da brilhante retórica que ele chamou de “um longo argumento”...

O “rigor científico das pesquisas” que Darwin conduzira é um exagero carelli-camarguiano: Darwin precisou, e muito, da ajuda de vários cientistas. Até catalogar os tentilhões de Galápagos que ele mandou sem etiquetas precisou da “mãozinha” do ornitólogo e taxidermista John Gould para dar esse “rigor científico”. As conclusões de Darwin “ofendiam” a todos os cientistas, não por causa de uma subjetividade religiosa, mas porque a hipótese transformista apresentava um mecanismo − a seleção natural − que não fechava a conta epistêmica: ela é conservadora na natureza. Carelli e Camargo nunca leram o Origem das Espécies. Tivessem lido, saberiam que no cap. 4, Darwin pede licença aos leitores para apresentar “dois exemplos imaginários de seleção natural”. Haja “rigor científico das pesquisas”...

Nem vou entrar muito em detalhes sobre a visão de criação do mundo, porque havia criacionismo e criacionismo [o termo classificando assim não existia] na era vitoriana, inclusive o de que “as espécies não mudam ao longo do tempo”. Assim como Darwin foi desonesto em não fazer essa distinção de posições de criação existentes na sua época e que ele conhecia, Carelli e Camargo aprenderam rapidamente a também mentir intencional ou não intencionalmente em nome de Darwin.

A idéia que Darwin parece combater − as espécies nascem plenamente formadas e não mudam − é encontrada em Paradise Lost de John Milton, um dos livros preferidos de Darwin e que levou na sua viagem no Beagle. Além disso, a posição de criação que Darwin ataca não é claramente definida no Origem das Espécies.[1] Então, Carelli e Camargo, qual visão de criação Darwin tentou se desvencilhar e combater?

Continuando como Advogado do Diabo, defendendo os de concepções dessas historietas da ciência mal-ajambradas pela VEJA e a Grande Mídia tupiniquim, a dificuldade da comunidade científica contemporânea de Darwin não foi somente porque o homem não seria um ‘animal superior’ aos demais e teria ‘ancestrais’ comuns com os macacos.

História da Ciência 101 – Origem das Espécies (1859): Embora Darwin visualize estender o alcance da seleção natural, ele não aborda a evolução humana naquele livro. É tão-somente no Descent of Man (1871) que Darwin vai abordar essa ‘inferioridade’ do ser humano. Ora, a humanidade não precisava de Darwin para contar esta história de origem humilde, pois há muitos relatos de criação. Um deles descreve uma origem muito mais inferior para a espécie humana: barro de barro. Mas, contrariando os queixumes infantis dos materialistas filosóficos, o ser humano, mesmo tendo essa origem humilde, seja pela visão evolutiva ou de concepção religiosa, ainda é mais do que somente um símio evoluído.

Phillip Kitcher, filósofo, da Universidade de Columbia, pelo menos, juntamente com Darwin, Dennett, é muito mais honesto do que muitos darwinistas: as especulações transformistas de Darwin, sem ajuda externa (seria ‘bullshit’ para ele), trazem sim no seu bojo ideológico o ateísmo – “enterrou o conceito de divindade”.

Agora o Kitcher que me perdoe, mas ele bem que poderia ter ficado calado ao afirmar que Darwin “pôs fim a milhares de anos de irracionalidade na comunidade científica e em parte da sociedade”. Gente, o que é que nós vamos fazer com Aristóteles, Platão, Sócrates, Descartes, Newton e outros luminares que lidaram com a questão da existência do ser humano. Kitcher, quem é Kitcher no pensamento ocidental? Alguém sabe quem é o Kitcher? Contrariando Kitcher et caterva, um dos memes evolutivos de sobrevivência humana − a religiosidade está cada vez mais forte.

A dupla “Carelli-Camargo” ficaram contaminados com o vírus kitcheriano do materialismo filosófico, e prosseguiram afirmando que “os ataques às idéias de Darwin prosseguiram por todo o século XX.” Só que esses ataques não partiram somente dos de concepções religiosas. Desde 1859, Darwin sofre o severo escrutínio científico de suas idéias: a cada 50 anos eles se vêem forçados a ‘recauchutar epistemicamente’ uma teoria que não é substanciada pelas evidências encontradas na natureza.

“A vitória das idéias de Darwin” é inequivocamente uma ‘vitória de Pirro’. Quem diz isso é uma História da Ciência objetiva, crítica e imparcial. Em 2010, a menos que a Nomenklatura científica se importe demais comigo, haverá uma iminente e eminente mudança paradigmática em biologia evolutiva. Razão? O neodarwinismo está morto há quase três décadas, mas eles teimosamente fazem ‘ciência normal’ em cima de um cadáver epistêmico putrefato. Não mudaram ainda por uma questão de celebrar o oba-oba hagiográfico secularista até 2009.

Carelli e Camargo citaram que “entre os grandes nomes” que revolucionaram a maneira de pensar da humanidade (Karl Marx e Sigmund Freud), Darwin é “o único cujas idéias ainda servem de base sólida para avanços extraordinários do conhecimento”. Uau, o “longo argumento” darwiniano foi elevado a Theoria perennis. A única Teoria do Tudo em ciência. Tenho más notícias, Darwin, é o “next kid in the block to fall” [em inglês é mais chique, vai ser o próximo a cair].

A teoria geral da relatividade, de Albert Einstein, trava “uma queda-de-braço constante com seus adversários, os teóricos da física quântica” porque uma teoria verdadeiramente científica precisa ser confirmada ou não. Os darwinistas não querem essa “queda-de-braço” com os seus críticos científicos. Contrariando o que essa dupla afirmou impensadamente, “Darwin só tem inimigos fora da ciência”, ele tem sim muitos críticos dentro da comunidade científica. Até membros de Academias de Ciência.

O desenvolvimento da genética “ajudou a explicar como funciona a transmissão das características hereditárias”, e Darwin realmente intuiu isso, mas o que vemos nos genomas das espécies é uma variabilidade limitada, e nenhuma instância de uma espécie se transformando noutra como ‘intuiu’ o guru de Down. Carelli e Camargo até podem ser perdoados, porque mais grave é a ignorância do biólogo David Mindell, da Universidade de Michigan, que ‘retoricamente’ afirmou que levou “um século de descobertas para que a teoria da evolução de Darwin se comprovasse plenamente, em todos os seus aspectos”. Caracas, meu, onde é que esse cara leciona, pesquisa? Ele não lê as publicações científicas onde as teses fundamentais da teoria geral da evolução de Darwin não são corroboradas? Eu, “um simples professorzinho do ensino médio” [será?] posso indicar para ele mais de 40 publicações.

Vou ser um Advogado do Diabo mais impiedoso ainda. Realmente, Darwin foi muito esforçado “até completar suas teorias” [segundo Ernst Mayr, são cinco]. Quanto à sua trajetória do homem por trás do cientista ter sido acidentada é que o bicho pega. Se você não tem uma teoria, de nada adianta as observações. Era o que Darwin dispunha durante e depois da viagem do Beagle. Depois, conversa vai, conversa vem com um cientista e com outro, a partir de 1838 ele começa a escrever, não o Origem das Espécies, mas o que ele chamou de minha “Grande Obra”.

Por que Darwin “demorou 21 anos para publicar o volume”? Será tão-somente porque ele “sabia que suas idéias cairiam como uma bomba sobre uma sociedade habituada a buscar a verdade nas páginas da Bíblia”? Isso soa meio deslocado historicamente porque a Bíblia já não era assim uma Brastemp na Inglaterra vitoriana e no continente europeu. Umas três décadas antes de Darwin, já se falava em evolução, e a Bíblia não era mais um livro de fé e prática.

Sem dúvida que em 1844 ele escreveu a um amigo dizendo que divulgar suas idéias seria “como confessar um assassinato”, mas será que na sua consciência, Darwin que já não era mais religioso, podia até ter se debatido com “questões morais aflitivas”, mas ele não teria demorado todo esse tempo para elaborar a sua teoria da evolução pela seleção natural somente tentando se resguardar de ser apanhado com a mão na cumbuca por ter plagiado as idéias de outros naturalistas como Alfred Wallace e Edward Blyth? Leiam o livro Darwin’s Century de Loren Eiseley [Londres, Golancz, 1959] e tentem descobrir quem era esse tal de “Mister X”. Sou cético das conclusões dele, mas coloco aqui para mostrar que um cientista da cepa de Eiseley é um crítico de Darwin dentro da ciência.

É falso o afirmado por Carelli-0Camargo que Darwin “na juventude, pretendia tornar-se sacerdote”. Ele não era muito dado a estudos. Foi seu pai com espanto que viu que o menino seria “a vergonha da família”, que pensou fazer dele um pastor anglicano.

Não vou abordar aqui as questões de idade da Terra, e nem se os estudos deles “sobre a evolução das espécies se desenvolviam, entravam em choque com todos os dogmas religiosos”, porque eles também entravam em choque com a comunidade científica. Dialogando com os cientistas, Darwin se viu obrigado a escrever quatro capítulos tentando rebater as objeções deles. Todas as críticas eram cientificamente embasadas. 30% da obra! Nem tampouco se Emma “subiria aos céus e ele desceria ao inferno”, porque o naturalista se tornou agnóstico durante o processo de elaboração de sua teoria da evolução.

Carelli e Camargo de VEJA, vocês deveriam ter pesquisado mais sobre Darwin.


NOTA:

[1] GALE, B.G.,
Evolution Without Evidence: Charles Darwin and The Origin of Species, University of New Mexico Press: Albuquerque NM, 1982, p.139